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"Eu ... não quero ver você exibindo suas partes por aí": Exibicionismo, autorização* e boa maternidade em percepções de amamentação em público

Do site Instituto Girassol - Comunidadee

05/09/2016

Nessa pesquisa, publicada no Geoforum, observou-se que o estigma e a preocupação com a amamentação pública foram identificados como contribuindo para baixas taxas de amamentação em países de alta renda. Entre os poucos estudos existentes sobre a percepção pública da amamentação, uma pesquisa no Reino Unido apontou a falta de familiaridade com o aleitamento, visões sexistas e hiper-sexualização da mama como fatores para a baixa taxa de aeitaento materno no país (uma das menores no mundo).

Durante o ano de 2014, vários casos de mulheres sendo criticadas por amamentação em público apareceram na mídia e uma abordagem de Análise Crítica do Discurso foi usada para enquadrar teoricamente a avaliação de 884 comentários, que apareceram naturalmente a partir do site de notícias do Reino Unido mais popular on-line, o Mail Online.

Os resultados são discutidos em relação aos papéis de mães como cidadãs e seres sexuais, com um foco particular sobre a visibilidade dos seios no espaço público. Mulheres que amamentam em público eram vistas como pouco atraentes, preguiçosas, más mães e com falta de autorrespeito e, mais especificamente, como exibicionistas. Esta opinião foi contrastada com a conveniência de amamentação dentro da casa, o que foi visto como uma forma adequada de alimentar uma criança. A inconveniência de amamentação pública foi inerentemente ligada à sexualidade, com mulheres que amamentam vistas como agressoras sexuais ("exibicionistas") ou convidando homens ao contato sexual. Argumenta-se que esses pontos de vista são originários de relações desiguais de gênero na sociedade e no enquadramento dos seios como conteúdo sexual ao invés de nutricional, no Reino Unido.

outrização (do original “othering”): Processo de enxergar ou retratar outra pessoa como diferente ou estranha. Em português: (traduzido e utilizado por alguns como “outrização”) ainda não encontrado em dicionários.

Comentário:
Aqui no Brasil, como em muitos países do mundo, esses fatores culturais ainda pesam a ponto de termos observado a proliferação de leis nas cidades e estados da União, punindo estabelecimentos em que uma mãe que esteja amamentando seja, de alguma forma, constrangida.

LEI Nº 16.161 (promulgada em 13/04/2015), foi um marco na cidade de São Paulo, para a mudança dessa mentalidade. Infelizmente, ainda é necessário que se faça uma lei para que uma mãe seja “autorizada” (e não “obrigada”) a amamentar seu filho, em qualquer hora e em qualquer lugar (livre-demanda) sem que isso seja visto como um ato de exibicionismo ou agressão.

Com essa base, já está em trâmites no Senado o projeto de lei nº 514, de 2015, Senadora Vanessa Grazziotin, que “dispõe sobre o direito à amamentação em público, tipificando criminalmente a sua violação e garante o direito à amamentação em público, transformando em crime a sua violação, que também ensejará indenização por danos morais à vítima”.

O texto desse projeto de lei, aprovado em 24/08/2016 pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), indica que “quem proibir a lactante do exercício desse direito estará sujeito a até 100 dias-multa”. O valor de um dia-multa é definido pelo juiz em função de cada caso, podendo chegar a cinco salários-mínimos. Ou seja, a punição máxima — de 100 dias-multa — seria de R$ 440 mil.

Também segundo o texto, caberá à mãe a decisão sobre a utilização ou não de local reservado para amamentação, quando disponível. A abordagem para dar ciência à lactante sobre a existência da sala de amamentação deve ser feita “com discrição e respeito, sem criar constrangimento para induzir ao uso desses recursos”.

Última notificação do Senado consta que em 01/09/2016 a proposta encontra-se na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (Secretaria de Apoio à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania), aguardando designação do relator.

Quando abordamos causas para o desmame precoce, qualquer ação que ameace ou tire da mãe a naturalidade do aleitamento pode ser responsável por criar um obstáculo à amamentação, trazendo prejuízos consideráveis à saúde dessa criança, ao vínculo familiar, chegando até a influenciar, de forma a se considerar, a economia do país, pela perda da proteção gerada pelo aleitamento materno na saúde das crianças.

Publicação: Science Direct
Fonte:
 Grant, A. (2016). “I… don’t want to see you flashing your bits around”: Exhibitionism, othering and good motherhood in perceptions of public breastfeeding. Geoforum, 71, 52-61.
DOI:http://dx.doi.org/10.1016/j.geoforum.2016.03.004

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545