Publicações > Meus Artigos > Todos os Artigos

VOLTAR

Promoção do Leite Materno? Como assim?

Do BLOG da Editora Timo

por Dr. Moises Chencinski - colunista

30/11/2023

PROTEGER, APOIAR e PROMOVER o aleitamento materno tem sido um dos grandes desafios do último século, ou pelo menos dos mais recentes 50 anos. Muitas ações foram e são ainda desenvolvidas nesse sentido por profissionais éticos, gabaritados e empenhados.

Pensando bem, o leite materno não deveria ter que passar por tantos obstáculos até ser reconhecido como uma fonte de saúde, porque ele é cientificamente o padrão ouro da alimentação infantil desde a sala de parto até 2 anos ou mais, exclusivo e em livre-demanda até o sexto mês.

Ao analisarmos as estatísticas e os dados sobre a amamentação no Brasil, houve uma grande evolução entre 1.970 a 2.006 e parece que estamos estacionados ou, pelo menos, num ritmo muito aquém do que o desejado desde então.

Estudos recentes e a última estatística nacional (ENANI-2019 – relatório – 4) mostram que a evolução desde 1.996 até 2.019 não tem sido homogênea. Para essa análise, dois dados podem ser úteis para esclarecer a diferença de evolução em dois períodos distintos (1.996-2.006 e 2.006-2.019)

- Taxa de aleitamento materno exclusivo em crianças abaixo de 6 meses:

1.996 – 23,9%
2.006 – 37,1%
2.019 – 45,7%

- Mediana de aleitamento materno exclusivo (média de tempo):
1.996 – 1 mês
2.006 – 2,2 meses
2.019 – 3 meses

Então me acompanhem aqui.

- Leite materno é o alimento ideal para lactentes.
- As taxas de aleitamento aumentaram significativamente entre 1.976 e 2.006.
- As taxas de aleitamento travaram em sua evolução entre 2.006 e 2.019.
- As estratégias são de PROTEÇÃO, APOIO e PROMOÇÂO do aleitamento materno.

O que está acontecendo? Como modificar esse panorama?


NA PROTEÇÃO

- Amamentar em púbico não é aceito socialmente.
- Uma gestante recebe publicidade a respeito de produtos que podem influenciar sua decisão de amamentar ou não seu bebê (fórmulas, mamadeiras, chupetas).
- Uma mãe que vai voltar ao trabalho, quer ou precisa deixar o bebê em uma creche e essa creche não recebe o leite dessa mãe para oferecer enquanto ela trabalha.
- Um recém-nascido que está bem é separado de sua mãe logo após o parto e não passa pela Golden Hour (hora dourada) e não tem o contato pele a pele e não recebe o estímulo da possibilidade de mamar na primeira hora de vida.

Percebe como uma mãe precisa ser protegida de tantas dificuldades para pelo menos ser informada adequadamente a respeito do aleitamento materno e, a partir daí, definir qual o plano de alimentação para seu bebê?

O aleitamento materno é um direito humano que precisa ser respeitado, cumprido e PROTEGIDO de influências pesadas como o marketing agressivo da indústria de alimentos infantis, da falta de conhecimento sobre dificuldades/soluções do AM (por parte principalmente de mulheres e profissionais de saúde), dentre outros.

As principais ferramentas de proteção do aleitamento materno são a INFORMAÇÃO e LEGISLAÇÃO.

A INFORMAÇÃO ética, atualizada, baseada na ciência deve ser disponibilizada na internet nas redes sociais e através dos profissionais de saúde materno-infantil que não tenham conflito de interesses.

A LEGISLAÇÃO que já existe precisa ser divulgada, informada e explicada de forma a permitir a compreensão mais fácil para todas as pessoas. E temos muitas leis que PROTEGEM a amamentação. Aqui vou só citar algumas:

- NBCAL – Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes e Crianças de Primeira Infância;
- Leis que protegem mães na amamentação em público;
- Empresas Cidadãs com a ampliação das licenças paternidade e maternidade;
- Iniciativa Hospital Amigo da Criança; 

Mas, cerca de 40% das mulheres trabalhadoras no Brasil estão em empregos informais, não protegidas pela legislação, sem direito a uma licença maternidade que favoreça a amamentação, gerando um desmame muito precoce, influenciando, de maneira importante, a saúde materno-infantil.

Com ações na área de PROTEÇÃO da amamentação, conseguimos não permitir que as taxas regridam. Isso já é importante, mas é só uma primeira fase.


NO APOIO

A amamentação traz benefícios para a saúde do bebê (lactente), da mãe (lactante) e do planeta e sempre é fundamental APOIAR essa ação, em todos os setores da sociedade.

Profissionais de saúde materno-infantil devem estar presentes desde o pré-natal, no parto em uma maternidade, com a hora dourada (clampeamento oportuno de cordão, contato pele a pele e a primeira mamada já na sala de parto) e a atenção no alojamento conjunto. Após a alta, o acompanhamento de puericultura (consultas de rotina) e o aconselhamento em amamentação, com escuta ativa, empatia, sem julgamentos, apoiam a mulher a se empoderar e acreditar na sua capacidade de cuidar de seu filho.

O governo (através de políticas públicas) e os empregadores (respeitando a legislação da mulher trabalhadora e até com criação de salas de apoio para amamentação ou coleta e armazenamento do leite materno extraído) também são importantes.

Os meios de comunicação e as redes sociais contribuem com informações éticas, embasadas na ciência e seguindo a lei, abrindo espaços dedicados à informação sobre a importância do aleitamento materno e divulgando informações e campanhas sobre o aleitamento materno (Semana Mundial e o Agosto Dourado) e doação de leite humano.

Com ações na área de APOIO da amamentação, conseguimos manter as taxas de amamentação em uma base sólida, sustentada.


NA PROMOÇÃO

A promoção do aleitamento materno deve ser prioritária quando se pensa em melhoria da saúde e da qualidade de vida das crianças e de suas famílias. Com ações na área de PROMOÇÃO da amamentação, conseguimos elevar as taxas de aleitamento materno.

A importância do aleitamento materno deveria ser parte fundamental na educação, desde o ensino fundamental, para a criação de uma cultura, com sequência até os cursos superiores de qualquer área de atividade humana, especialmente para todos os profissionais e serviços de saúde. 

Mas, o que é feito para PROMOÇÃO do aleitamento materno que o marketing, nem sempre ético, das indústrias não faça “melhor”?  Talvez seja aqui que precisemos evoluir de forma mais eficaz. Talvez seja necessário “modernizar” nossas abordagens, com visões mais atualizadas, focadas em onde está o “público-alvo”, nesse momento (nas redes sociais).

Quando falamos em desromantizar a amamentação, inicialmente nos referimos a questões relacionadas às emoções, às práticas de aleitamento materno, a não fazer acreditar que amamentar seja fácil, simples e sem desafios. Essas propostas afastam as mães de uma realidade que podem enfrentar e que pode não ser tão natural quanto se desejaria.

Mas, não há como manter a ideia de que só pelas emoções, pela boa vontade, pela ciência, por apelos ao bom senso, pelo ativismo se atingirá um aumento significativo das taxas de aleitamento materno. Isso não tem acontecido pelo menos desde 2.006. É preciso desromantizar também esse processo.

Como ajustar todos esses dados a mudanças reais na prática da amamentação, ou “vender a ideia”, utilizando práticas de marketing que a indústria, por exemplo, já domina há muito tempo, com profissionalismo, mas de uma forma ética, sem conflitos de interesses, através das redes e mídias sociais e aí sim, com uma narrativa adequada, promover o aleitamento materno?

Parece frio e calculista, não parece? Gente, estamos em 2.023 e a internet tem mais de 50 anos. O marketing já utiliza as redes sociais, que apareceram e se difundiram no Brasil entre 2.005 e 2.010, de forma abusiva e sem escrúpulos, para “vender doenças” como obesidade, tabagismo, estética. E vendem.

O diferencial? A indústria e seu marketing se modernizam e se atualizam, buscando apenas lucros financeiros e mais poder, através de técnicas e ferramentas que se atualizam constantemente e PROMOVEM seus produtos.

O ativismo com ética e sem conflito de interesses é a nossa base.

As estratégias digitais são uma realidade e só tendem a evoluir e disseminar.

Nossa opção poderia ser nos "adaptarmos" ao uso dessas ferramentas, através de profissionais da área, que talvez nos levem a uma evolução mais significativa nas taxas de aleitamento, com mais agilidade e eficácia? O que você pensa disso?

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545