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Alergia alimentar: mais perto do que você imagina

09/11/2015



Os tempos modernos nos propiciam muitas facilidades e avanços para “melhorar” nossa qualidade e até quantidade de vida. Assim temos carros repletos de novos botõezinhos e aplicativos, novos recursos de comunicação cada vez menores e cada vez mais ágeis (Smartphones, iPods, iPads, tablets, etc), a comida que você quiser vem até você nas mais variadas opções, a TV traz o cinema para dentro da sua casa, com qualidade.

Porém, associado a essa enxurrada de “comodidades”, temos muitas “comorbidades” surgindo e se expandindo. Sedentarismo, alimentação excessiva, industrializada, sono mais curto, mais tarde são resultados da necessidade de acompanharmos o progresso do consumismo e da informatização de nossas vidas.

Segundo o historiador Leandro Karnal, uma das consequências das redes sociais é que “o aqui não está junto com o agora”. Você chega a um restaurante com um amigo, ou sua família e, ao invés de simplesmente curtir o momento e a refeição com a sua companhia, você fotografa com seu “celular”, encaminha a imagem para o Instagram e para o facebook, para que milhares de pessoas que você não conhece vejam onde você “está” (?), com quem você “está” (??) e o que “está comendo” (???). Nesse momento (agora), você não está ali (com a sua companhia ou comendo o seu prato), está?

Isso também está acontecendo com a nossa alimentação. Lembra-se quando foi a última vez que você comeu seu prato caseiro simples de arroz, feijão, bife e salada? Ou quando o seu café da manhã foi só um leite, um pãozinho com manteiga e uma fruta? Hoje pipocam por aí sites para ensinar as mães a prepararem lanches saudáveis variados para que as crianças se alimentem adequadamente na escola. E a TV estimula até crianças a aprenderem os valores de uma “boa cozinha”.

Sabendo como os pais trabalham e como as mães não têm mais tanto tempo assim para dedicar à elaboração de uma refeição para seus filhos, as indústrias alimentícias rechearam os supermercados e lojas de alimentação de uma refeição fácil de preparar, carregar e rápida de comer.

As consequências que nós, profissionais de saúde, observamos de forma crescente em nossos atendimentos pediátricos é o aumento das doenças crônicas epidêmicas não transmissíveis (DCNT) como a obesidade infantil, hipertensão arterial, dislipidemias (problemas de colesterol e triglicérides) e diabetes tipo 2, entre outros. Mas, além disso, o que temos notado com evolução assustadora é o quadro de alergias alimentares, em nosso meio, especialmente a alergia à proteína do leite de vaca (APLV).

Um estudo recentíssimo que foi apresentado no congresso da Academia Americana de Pediatria de 2015, trata dos resultados de uma pesquisa do programa EPIPEN4SCHOOLS, que abasteceu com a EPIPEN* (uma injeção de adrenalina que é usada como tratamento de emergência, em casos crises agudas de alergia que podem levar á morte) cerca de 59.000 escolas (públicas e privadas), facilitando o acesso em casos de anafilaxia.

Segundo essa pesquisa, entre as 6.019 escolas que participam do programa e que responderam aos questionários entre 2013 e 2014, foram relatados 919 eventos anafiláticos. 75% dos quadros foram tratados com a injeção e 18% com outro tipo de medicação (anti-histamínicos).

Mas o dado que chama atenção é que 22% desses casos não havia nenhum antecedente ou suspeita de alergia conhecida e tiveram sua primeira crise alérgica grave na escola. Os agentes desencadeadores mais frequentemente relatados foram alimentos (62% dos casos) e picadas de insetos (10%). Em 20% dos casos não foram identificados esses agentes.

Precisamos rever algumas políticas de saúde do nosso país. Crianças alérgicas não podem depender da sorte para não terem suas crises nas escolas, nos restaurantes ou comendo pipoca em um cinema. É fundamental que se disponibilize de condições para que possamos:

  1. Evitar essa crescente onda de “alergização alimentar” que pode ter começado com aquela primeira e única mamadeira de fórmula infantil dada nas maternidades, sensibilizando essas crianças e trazendo tantos transtornos familiares no que diz respeito ao rígido controle da alimentação materna e familiar.
  2. Diagnosticar e tratar adequadamente as crianças (e adolescentes e adultos) alérgicas, sem menosprezar e nem exagerar nos exames, testes, dietas e tratamentos medicamentosos.
  3. Prover as famílias e os alérgicos de tratamento eficaz e seguro para que, quando a crise ocorra em locais com difícil acesso a atendimento de urgência de saúde, o atendimento de urgência possa fazer diferença e salvar uma vida (EPIPEN JÁ).
  4. Divulgar de forma mais abrangente, para toda a população, os riscos que cada um de nós pode ter em relação a crises alérgicas. Obrigar as empresas e indústrias a disponibilizarem em seus rótulos, de forma clara e legível, os componentes de seus produtos para conhecimento de todos. #poenorotulo

Só a partir dessas ações, podemos imaginar que um quadro, que a cada dia acomete mais pessoas no Brasil, especialmente crianças, como a ALERGIA ALIMENTAR, está recebendo a devida atenção dos nossos poderes públicos e dos profissionais de saúde.

*No Brasil não temos nem o EPIPEN nem algum tratamento semelhante que costuma ser orientado para uso de pacientes gravemente alérgicos. Esse medicamento pode salvar a vida de um alérgico. Nos Estados unidos, cada alérgico grave carrega consigo uma injeção como essas com todas as orientações de uso. A importação desse produto não está liberada e a fabricação aqui no Brasil parece longe de ser algo real.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545