Quem já viajou de avião e pelo menos uma vez prestou atenção ao que diz a aeromoça ou comissária de bordo, ouviu essa explicação:
"Pedimos a sua atenção para demonstração do nosso equipamento de emergência. Em caso de despressurização, máscaras individuais cairão automaticamente dos painéis acima de seus lugares. Neste momento, puxe a máscara mais próxima para liberar o oxigênio, aplique-a sobre o nariz e a boca, ajuste o elástico a volta da cabeça e respire normalmente. Passageiros viajando com crianças ou alguém que necessite de ajuda, lembramos que deverão colocar suas máscaras primeiro para em seguida auxiliá-los."
Por mais cruel e ilógica que essa informação possa parecer, se essa orientação não for seguida dessa forma, o passageiro e a criança correm riscos maiores de morte. Guardadas as devidas proporções, de nada adianta a imensa preocupação com as crianças se antes de tudo não soubermos cuidar de nós.
Assim, por mais difícil que possa parecer, a alimentação adequada, em horários regulares, hidratação, atividade física regular e estilo de vida saudável (não beber, não fumar e dormir bem) são a chave para que a gravidez, a maternidade, a amamentação e a vida após ter um filho não se transformem em um grande pesadelo para a futura mamãe.
E esses fatores interferem entre si. É necessário o equilíbrio entre eles, na medida do possível para que essa história tenha um começo, um meio e um final felizes.
Para quem está habituado a dormir 8 a 10 horas por noite, sem interrupções, levantar uma só vez para ir ao banheiro pode transtornar de tal forma a dinâmica da noite que a sensação pode ser a de uma noite inteira mal dormida. Imaginem, então, o que acontece durante 9 meses de gestação, com tantas "interrupções noturnas urinárias" ou dificuldades de posicionamento da "barriga grávida" durante o sono, para se virar na cama.
Mas há sempre a expectativa que isso acabe quando o bebê nascer... e isso não acontece. Já não há mais o pipi-stop noturno, a barriga não impede mais a movimentação na cama, mas o bebê precisa mamar o seio materno e isso pode ocorrer, pelo menos para os bonzinhos, em intervalos de 2 a 4 horas, por períodos de 10 a 30 minutos de cada lado, pelo menos nos primeiros 6 meses (aleitamento materno exclusivo até o 6º mês, de acordo com orientação da Organização Mundial de Saúde e a Sociedade Brasileira de Pediatria).
Como manter o bom humor, a "sanidade mental", as atividades normais em uma situação assim?
Entre os vários fatores que necessitam desse equilíbrio, o sono adequado, junto com a alimentação, talvez sejam o ponto de partida para um dia feliz.
- Trabalhos mostram que
- - Mulheres acordam mais do que os homens durante a noite (44 minutos contra 30 minutos dos homens - Sarah Burgard – Universidade de Michigan), mais marcante logo após o nascimento e nos anos durante o crescimento dos filhos, em parte pela insegurança na realização das tarefas e pela falta de um sono regular do bebê nos primeiros dias, gerando uma mãe mais cansada e depressiva.
- As mães, mesmo as que trabalham, são duas vezes e meia mais propensas do que os pais a acordarem no meio do sono para tomar conta de seus filhos (no 1º ano de vida – 32% das mulheres e 11% dos homens entre 20.000 casos avaliados entre 2.003 e 2.007 – mesmo estudo / no 2º ano de vida 10% contra 2% e de 3 anos de vida ou mais 3% das mães e 1% dos pais).
- Os bebês de mulheres com quadros depressivos antes de engravidarem ou durante a gestação têm maior chance de ter sono irregular durante os primeiros 6 meses de vida, cochilando mais durante o dia, demorando mais para adormecer à noite e acordando mais vezes nesse período.
- Manter um padrão adequado ao bebê, com rotinas saudáveis de horários de alimentação (mamadas ao seio), banho, e sono trazem mais tranqüilidade à família e, conseqüentemente, noites mais calmas, mais cedo do que as que não apresentam essa dinâmica. - E o que fazer com as rotinas da casa?
- Isso tudo sem contar outras rotinas da vida da mamãe, tais como, troca de fraldas, por para arrotar, fazer a cólica passar, preocupação com o bem-estar do bebê, cuidados da casa, etc., etc. e muito mais etc.
É mais difícil correr atrás do prejuízo, na hora do aperto, em que os problemas assumem proporções imensas e nada que se faça parece ser suficiente para resolver o problema. E aí, cada vez, mais, literalmente, a mamãe perde o sono.
Então, é importante que essa rotina se estabeleça bem antes de o bebê nascer. Durante o pré-natal, as consultas de rotina podem ser usadas para troca de informações com o médico a respeito não só das alterações clínicas como ganho de peso, náuseas e azias, problemas de pressão, como também, das angústias e preocupações que povoam o imaginário da futura mamãe e, porque não, do futuro papai.
A qualquer sinal de mais tristeza, insegurança, depressão, o médico deverá ser informado. Essa atitude fará com que a gestação possa ser passada sem tantos inconvenientes, que condutas possam ser tomadas de forma mais eficaz, para que, após o parto esse não seja mais um fator de desequilíbrio na vida dessa família.
O vínculo familiar é fundamental para que a mulher, futura mamãe, possa ter condições de cuidar de seu bebê, possibilitando o aleitamento materno exclusivo até o 6º mês de vida. Assim, é importante que responsabilidades sejam compartilhadas pelos membros da família (papai, avós, babás, auxiliares, entre outros). Essa atitude diminuirá a pressão nessa mãe que poderá cuidar melhor de si para ter condições de cuidar melhor de seu bebê (ainda lembram da máscara de oxigênio do avião?).
Assim, para que o sono da mamãe seja adequado, apesar dos despertares noturnos esperados, pelo menos nos primeiros meses de vida do bebê, além das dicas mais comuns como aproveitar para dormir sempre que o bebê dorme, evitar alimentos estimulantes como cafeína, o álcool (muito cuidado) há esperança através de outra postura. - Outras atitudes que podem ser tomadas desde a gestação
- - Pré-natal adequado, regular, com médico de confiança e aberto a entender que ele está atendendo muito mais do que "uma barriga grávida", ouvindo e oferecendo apoio e suporte também emocional durante essa fase.
- Vínculo familiar com compartilhamento de responsabilidades, permitindo que a mamãe possa se alimentar e dormir em condições satisfatórias e adequadas para curtir e propiciar um bom crescimento e desenvolvimento de seu bebê, sem que isso se transforme em sacrifícios e perda de sua saúde.
- Alimentação equilibrada, sem "comer por dois".
- A mamãe não pode abrir mão de cuidar de si. Ioga, meditação, atividade física são importantes para que se atinja um equilíbrio e se recuperem energias despendidas.
- Evitar atividades que podem interferir no sono. Computadores, televisão, exercícios nos intervalos em que haja possibilidade de dormir devem ser trocados por outras atividades que facilitam a indução do sono como banho morno, leitura, ambiente mais calmo, mais escuro, ouvir música relaxante, exercícios de respiração, e até o leite morno. Enquanto isso, a família se encarregará de suprir a ação da mãe nos cuidados da casa e do bebê nas quais ela não seja indispensável (como na amamentação).
- É melhor que a mamãe tenha sonos curtos, porém diretos, do que os picadinhos. Para isso é importante entender melhor a dinâmica do sono.
Entre a hora que nós nos deitamos para dormir e a hora de levantar, passamos por vários estágios no nosso sono. E cada uma dessas fases tem suas características próprias. - Sono NREM (não REM)
- Vigília ou Estágio 0
É o período de latência do sono. Nós nos deitamos e, às vezes, levamos um tempinho até adormecer (5 a 15 minutos após deitar). O tônus muscular ainda está acentuado.
Estágio 1
Essa fase dura de 2 a 5% do sono. É a passagem da vigília para o sono mesmo. A melatonina é liberada e induz o sono. Há uma redução do tônus muscular.
Estágio 2
De 45 a 55% do sono todo. Diminui o ritmo cardíaco e respiratório, musculatura relaxa mais e a temperatura do corpo cai (sono ainda leve).
Estágio 3
3 a 8% do sono total. Costuma vir muito junto com o estágio 4. Diminuição progressiva do tônus muscular, raros movimentos dos olhos.
Estágio 4
10 a 15% do sono total. Pico de liberação do GH e da leptina (lembra?). Sono mais profundo. - Sono REM
- 20 a 25% do sono total. É o grau máximo de hipotonia muscular. É a fase dos movimentos oculares rápidos (REM) que representa a presença dos sonhos e pesadelos (a grande maioria acontece nessa fase).
Trabalhos também mostram que quando se suprime ou se interrompe o sono nessa fase, podem ocorrer transtornos importantes de comportamento e de humor pela falta desse período. Assim, é melhor que haja sonos curtos, porém sem interrupções, do que o sono picadinho. Para finalizar, é importante que fique claro: não há mágicas e nem milagres. Nada substitui o sono a não ser... o próprio sono. E o principal problema da mamãe não é não ter sono e sim ter seu sono interrompido na hora de dormir e não ter o tempo para "compensar" essa sua necessidade em outro período do dia.
O importante é propiciar as condições para que essa mãe possa dormir, da forma mais saudável possível, quando ela tiver o tempo para isso. E que se crie, temporariamente, uma nova rotina de descanso. Mas, para o sucesso dessa empreitada, é fundamental que a mamãe se conscientize da importância de sua saúde bio-psico-físico-social para que possa cuidar bem de si e de seus filhos.
Essa é uma das matérias que não foi publicada na Revista Cláudia. As perguntas (boas) foram feitas, o material foi preparado, mas a matéria, ninguém explica a razão, não saiu. Assim, como o tema é bom, as perguntas foram boas, a matéria ficou boa, vai aqui no site mesmo para divulgação.