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Mais frutas no cardápio
03/09/2011
Pediatra explica que as crianças já nascem preparadas para o paladar doce e que sobremesas como pirulitos e chocolates só devem ser oferecidos após um ano de idade.Lia Lehr
Um estudo realizado pela Universidade Estadual de Louisiana, nos Estados Unidos e publicado recentemente, diz que crianças e adolescentes que comem doces tendem a ganhar menos peso durante a vida adulta e que correm menos riscos de sofrerem de obesidade. Será mesmo?
A pesquisa foi feita por Carol O’ Neil e avaliou 11.182 pessoas, divididas em dois grupos. O primeiro, com crianças com idades entre 2 e 13 anos. O segundo grupo era formado por adolescentes e jovens entre 14 e 18 anos. De acordo com o estudo, apesar destas crianças terem uma entrada maior de energia no organismo, eles eram, respectivamente, 22% e 26% menos propensos a ter excesso de peso em comparação a outras crianças que não consumiam doces com regularidade.
A justificativa seria que estas crianças que ingerem açúcar com freqüência teriam mais facilidade para ingerir e eliminar calorias de forma mais eficiente, adquirindo equilíbrio ao longo do tempo.
"Sempre é necessário que se tome muito cuidado quando trabalhos científicos são traduzidos e simplificados para facilitar sua compreensão e abordagem. Não é raro que essa prática gere conclusões errôneas a respeito de seus resultados. Esse trabalho divulgado recentemente na mídia, concluindo que crianças e adolescentes que comem doces e chocolates tendem a ganhar menos peso durante a vida adulta, parecendo revolucionar todos os conceitos básicos da nutrição e da transformação de energia conhecida pela ciência atual, é mais um desses casos", diz o pediatra Moises Chencinski. A nosso pedido, o doutor Moises esclarece como foi realizado o estudo e esclarece algumas questões:
- Quem come doce na infância tende a ganhar menos peso durante a vida adulta?
- "Essa informação passa a impressão que essas crianças analisadas comeram doces diariamente nos dois grupos (de 2 a 13 anos e de 14 a 18 anos). Infelizmente, esses dados não são reais. O material coletado na pesquisa foi através da utilização de um recordatório alimentar de 24 horas. Isso significa que perguntaram a quase 11.200 crianças e adolescentes o que elas tinham comido nas últimas 24 horas. E foi a partir desses dados, ou seja, quanto de doces e chocolate foi ingerido nas últimas 24 horas antes da pesquisa, que foram feitas essas conclusões. Não se especifica nem que dia foi esse e se foi o mesmo dia para todos. Por exemplo, alguns podem ter sido interrogados em uma segunda-feira (após um domingo de festas) e outros em uma quarta-feira, no meio da semana", informa o médico.
Ainda de acordo com a pesquisa, crianças e adolescentes foram considerados menos propensos a ter excesso de peso em comparação aos que não consumiam com frequência. "Vale a mesma ressalva nesse caso. A conclusão de excesso de peso após consumo ou não de doces foi baseada em um recordatório de 24 horas. Deve-se ressaltar que o recordatório alimentar é um instrumento reconhecido em consultas nutricionais para avaliação da ingestão calórica, mas não isoladamente. Assim, além do recordatório, pesquisa-se a frequência semanal dos alimentos ingeridos, além de outros critérios utilizados para estudo das características dietéticas de um paciente", explica o doutor Moises.
"A própria autora destaca antes da conclusão de seu trabalho que o estudo, pela sua característica, não pode alinhar causas e efeitos. Carol O’Neil ressalta que o recordatório de 24 horas tem muitas limitações inerentes. Ele pode não refletir o consumo habitual e depende da memória de crianças e adolescentes. Os pais ou cuidadores das crianças de 2 a 11 anos foram os informantes e, embora tenham noção da alimentação da criança em casa, podem não saber referir adequadamente o que eles comeram fora de casa. E para finalizar, chocolates e doces foram combinados em um único grupo. Assim o potencial efeito do chocolate escuro não foi alcançado". - Para ficar de olho
- "Outros trabalhos mostram que a porcentagem de crianças e pré-adolescentes com sobrepeso e obesidade tem aumentado assustadoramente nas últimas décadas, sem relação com padrão sócio-econômico. As propostas atuais de tratamento da criança obesa ou com sobrepeso passam por um acompanhamento pediátrico adequado, pela reeducação alimentar, por atividade física regular, muitas vezes por apoio psicológico e não deve ser inicialmente utilizado nenhum tipo de medicamento", alerta o pediatra.
O médico lembra que a mudança de hábitos e tratamento para combater a obesidade infantil não deve ser direcionado apenas à criança, mas a toda sua família. "Sem o envolvimento da família com mudança das rotinas e dos hábitos alimentares será muito difícil atingir os objetivos propostos. Em uma fase inicial esse trabalho pode ser difícil e muito sofrido para a criança e para seus familiares. Mas, a médio e longo prazo, os resultados são animadores e justificam esse "sacrifício" inicial. Quanto mais tempo se leva para reverter esse processo, maiores as chances de depararmos com adultos obesos e com os problemas decorrentes dessa condição (diabetes, hipertensão, dislipidemias, entre outros)", aconselha.
O doutor Moises destaca ainda que, há estudos demonstrando que o incentivo à ingestão de alimentos saudáveis como frutas, verduras e legumes é mais eficaz do que a proibição absoluta de alimentos que contenham açúcar. - Então as crianças não devem comer doces, como balas e chocolates?
- "As crianças já nascem preparadas para o paladar doce. Os outros gostos (salgado, azedo, amargo) elas precisam aprender através da oferta variada de uma alimentação equilibrada. Nunca é demais lembrar que o ideal para a prevenção é sempre começarmos pelo ALEITAMENTO MATERNO EXCLUSIVO até o 6º mês de vida. Após o 6º mês, através das consultas de rotina com pediatras, a refeição complementar será introduzida de forma adequada para que a criança conheça os diversos sabores, texturas, temperaturas dos alimentos, criando, assim, um hábito saudável", conta o pediatra.
- Mais frutas no cardápio
- O médico lembra que o aleitamento materno deve ser continuado até 2 anos de vida e que a oferta de sucos e frutas deve ser estimulada a partir do final do aleitamento materno exclusivo. Crianças devem receber de 3 a 4 porções de frutas ao dia enquanto adultos 5 porções.
"Difícil? Nem tanto. Sobremesa deve ser igual à fruta. Assim, com uma fruta no café da manhã, uma depois do almoço, uma no lanche da tarde e uma após o jantar chegamos quase lá. A 5ª porção pode ser consumida através de um suco durante o dia. Como as crianças já nascem preparadas para o paladar doce, a introdução de sucos e frutas deve ocorrer sem nenhum percalço. Até um ano de idade, essa deve ser a oferta de "doces" que uma criança deve receber. As frutas podem ser oferecidas in natura (cruas e lavadas), cozidas, em forma de purês, isoladas ou em grupo (saladas de frutas)."
IMPORTANTE: Doces e chocolates (ou bolos, pudins, etc) não devem substituir a sobremesa que é a fruta. Eles podem ser oferecidos à criança após a sobremesa ou no lanche da tarde, sem prejudicar a aceitação da fruta. Não há uma quantidade mínima ou máxima que possa ser oferecida à criança. Devem prevalecer o bom senso e os limites. - E não esqueça
- "Se pensarmos que a cada vez que comemos devemos escovar nossos dentes, por exemplo, a permanência do doce por mais tempo em contato com o esmalte pode acarretar uma maior probabilidade de cáries. Assim, aquela balinha, aquele chocolatinho, aquele chiclete deve ser seguido imediatamente de uma escovação. Chato, não é mesmo? Aliás, vale a pena lembrar que a primeira consulta com odontopediatra já deve ser feita com o nascimento do primeiro dentinho do bebê. Assim, o profissional poderá passar essas e outras noções de higiene e cuidados bucais, já desde essa idade", lembra o pediatra.
Essa matéria foi publicada no site da Chris Flores (03/09/2011)
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545