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Alergia alimentar: uma doença infantil com repercussões futuras

Do site Jornal Brasil

Alergia infantil é um dos principais temas das consultas pediátricas, dos cursos e das dúvidas das mães nos últimos tempos… Na maior parte das vezes, temos o leite como principal suspeito e “carrasco” nesse processo

Por Márcia Wirth - MW CONSULTORIA DE COMUNICAÇÃO

19/05/2013

Primeiro, vamos a algumas informações importantes:

Entre 2 e 6% das crianças apresentam algum tipo de alergia alimentar no Brasil. Pelo fator cultural e social, o leite é o responsável por 85% desses casos (e não de todos eles), ou seja, pela matemática, cerca de 4 a 5% de todos os casos. Só para que se tenha uma ideia, nos Estados Unidos a principal causa de alergia alimentar é o amendoim (“cultura alimentar”);


• Não confundir alergia com intolerância alimentar. A alergia é uma reação do indivíduo ao alergeno, substância que entrou em contato com o organismo (quer tenha sido pela pele, pelo trato respiratório ou pelo digestivo). Já a intolerância alimentar não depende do sistema imunológico e revela uma dificuldade do organismo em metabolizar (ou digerir) determinadas substâncias (ou tipos de alimentos).  Assim, a alergia é diferente da intolerância. Não se deve confundir alergia à proteína do leite de vaca (APLV), que depende da substância (proteína) que provoca a alergia, com intolerância à lactose, que depende da quantidade dessa substância (lactose);

• A APLV não é um diagnóstico fácil. É importante valorizar as suspeitas clínicas. As principais manifestações das alergias alimentares são digestivas (diarreias, vômitos, sangramentos intestinais), dermatológicas (eczemas, descamações) e depois respiratórias.

Segundo alguns estudos, a proteína do leite de vaca seria responsável pelo aumento da produção de catarro e secreção, levando, então, a essa sintomatologia respiratória. Durante algum tempo, tentou-se substituir o leite de vaca pelo leite de outros animais (cabra, égua, camelo são os mais comuns registrados) no tratamento de otites e sinusites. As proteínas presentes nesses leites se mostram em taxas muito semelhantes (cerca de 90 a 95%), não sendo, dessa forma, válida a substituição para melhora dos sintomas.

O leite de soja, muitas vezes introduzido como tentativa terapêutica, também não representa a troca ideal. Segundo estudos, em cerca de 80-85% dos casos de APLV há alergia cruzada à proteína da soja.

Composição proteica dos leites

 Além das quantidades de proteínas serem diferentes nos leites, suas proporções distintas caracterizam sua digestibilidade e a alergenicidade específicas. Por exemplo, as proteínas correspondem a 11,5% da composição do leite humano e a 34% do leite de vaca, fato que pode, por exemplo, sobrecarregar os rins quando consumido em grande quantidade, aumentando a excreção de cálcio pela urina.

Independentemente do leite, seja ele materno, de vaca integral ou de fórmulas infantis, as proteínas presentes em sua composição são divididas em dois principais grupos: as proteínas do soro (principalmente a alfa-lacto-albumina – ALA e a beta-lacto-globulina – BLG) e a caseína. A caseína é uma das maiores (junto com a BLG) responsáveis pela APLV.

Sabe quando deixamos o leite fora da geladeira e ele coalha, formando grandes coágulos? Então, apresento a vocês a caseína, uma proteína que é grande e que tem uma absorção intestinal muito difícil.

Assim, para que essa proteína seja de fato digerida é necessário quebrá-la em pedaços menores, para facilitar sua absorção, sem uma sensibilização do sistema imunológico.

O LM tem a melhor e mais adequada proporção e evolução da relação proteínas do soro/caseína. O colostro apresenta 80/20 e o LM chega a 60/40. O LV contém cerca de 80% de caseína e 20% de proteínas do soro e as FI, seguindo orientação da ANVISA aqui no Brasil, apresentaram redução da quantidade de proteínas e promoveram a quebra da caseína em cadeias menores, formando proteínas mais solúveis, favorecendo a digestão e absorção, com melhor relação proteína/caseína visando aproximar essa relação ao que é encontrado no leite humano (60:40).

A BLG é o maior peptídeo do soro (45,0%-57,0%), representando, no LV, cerca de 3% e não está presente no leite humano (nem no leite de camela). Em termos quantitativos, a ALA é o segundo peptídeo do soro (15%-25%) do leite bovino e o principal do leite humano e caracteriza-se por ser de fácil e rápida digestão.

Como se vê, da parte do leite, a proteína é a grande responsável pelo quadro de alergia alimentar. Essa é uma das grandes razões para a insistência no aleitamento materno exclusivo (AME) até o 6º mês de vida e da não utilização do LV abaixo de um ano de idade.

Dois trabalhos publicados recentemente chamam a atenção a outras situações que podem favorecer o aumento da incidência de alergia alimentar.

O primeiro deles, apresentado durante uma sessão do encontro anual da Academia Americana de Asma, Alergia e Imunologia, relaciona o uso precoce de antibióticos (abaixo de um ano de idade), agravado pela repetição de seu uso com um aumento do risco de alergia alimentar.

Nesse estudo, comparou-se 1.105 crianças com alergia alimentar com 6.433 sem alergia alimentar, nascidas entre 2007 e 2009, com diagnósticos de alergia alimentar feitos antes de 31/12/2010, em sua frequência de uso, durações de tratamentos, idade de introdução da antibioticoterapia e os resultados foram considerados estatisticamente significativos.

Pacientes com asma, dermatite atópica ou eczema foram excluídos desse estudo por já apresentarem um risco maior de alergia alimentar e maior propensão ao uso de antibioticoterapia.

Os estudos mostraram um aumento significativo acima de três cursos de antibióticos, tendo seu pico em cinco cursos, comparando com menor importância no uso de 1-2 vezes, sendo os mais usados a penicilina e seguida das cefalosporinas.

Comparando-se o uso de antibióticos entre 0 e 6 meses e 7 e 12 meses, notou-se um maior risco de incidência de alergia alimentar no grupo mais tardio, justificando-se ser essa a época de introdução de novos alimentos à criança (após o aleitamento materno exclusivo até o 6º mês).

Os achados desse estudo apontam fortemente para a hipótese de que uma alteração da flora intestinal (microbiota) que ocorre após a exposição ao antibiótico pode contribuir com o aumento da prevalência de alergia alimentar na infância, mesmo necessitando, ainda, de mais estudos para estabelecer de forma mais definitiva essa relação e até se algum tipo específico de antibiótico poderia ter um efeito mais intenso do que outros.

Um outro estudo publicado no Journal of Allergy and Clinical Immunology relaciona a falta de vitamina D com um aumento de até 3 vezes na tendência a alergia alimentar na infância, especificamente, com eczema.

Foram avaliadas 5.276 crianças com um ano de idade, com um teste cutâneo a amendoim, gergelim e clara de ovo, ao mesmo tempo em que foram colhidas amostras de sangue de 780 dessas crianças para dosagem de vitamina D.

Esse trabalho pode ser o passo inicial para evidenciar que níveis adequados de vitamina D no sangue podem representar, entre muitas outras questões, também um importante fator de proteção contra alergia alimentar no primeiro ano de vida.

Segundo o CDC (Centers for Disease Control and Prevention), a alergia alimentar tem aumentado nos últimos 10 anos, atingindo 4% das crianças nos Estados Unidos, enquanto na Austrália, esse número está chegando até 10%.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545