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Nem sempre é doença

Da revista Metrópole (Campinas)

Muita calma nessa hora: febre infantil é um dos principais motivos de atendimento em pronto-socorros, mas especialistas recomendam calma e critério para não haver exagero na medicação

Karina Fusco (karina.fusco@rac.com.br)

30/06/2013

Ela chega de repente, sem dar aviso. Em pouco tempo, a criança já se mostra mais quieta, vai ficando vermelha e quente. Muitas vezes, a palma da mão e a planta dos pés ficam geladas. E basta pegar o termômetro para confirmar: é febre. Seja por um resfriado corriquei o, por uma infecção viral ou bacteriana, o aumento da temperatura costuma deixar pais e mães preocupados, desesperados até. Nos pronto-socorros pediátricos, a estimativa é que as doenças febris sejam responsáveis por até 50% dos atendimentos. Também não são raros os casos em que os filhos são levados com poucas horas de febre e sem qualquer sinal aparente.

Na opinião do pediatra Marcelo Conrado dos Reis, coordenador do Serviço de Emergência Pediátrica do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o grande problema é o conceito errado de que febre é doença. “Na verdade, ela é uma resposta normal de defesa do organismo, importante para ajudar a exterminar algum micro-organismo nocivo, como bactérias e vírus. Acontece que os pais acreditam que ela é perigosa, mas o risco está na doença por trás dela”, explica. “Com a febre, aumenta a produção de anticorpos e glóbulos brancos, dificultando ou até inibindo a multiplicação de agentes infecciosos”, acrescenta o pediatra Yechiel Moises Chencinski, membro do Departamento de Pediatria Ambulatorial e Cuidados Primários da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP).

O médico da Unicamp esclarece ainda que alta temperatura nem sempre é sinal de gravidade. “Há doenças benignas, como a roséola, que dão febre alta e outras graves, como a pneumonia, que podem dar febre baixa ou hipotermia”, exemplifica. O mais importante é o estado geral da criança. “Se ela está brincando e sorrindo, dificilmente, tem alguma doença grave. Então, não há urgência em levá-la ao pronto-socorro. Preocupante é se ela está largada, não responde aos estímulos nem quer brincar, se está pálida ou respirando muito rápido. Nesses casos, até que apareça algum outro sintoma, ela deve ser avaliada por um médico a cada 48 horas”, diz.

Segundo Reis, apenas nos bebês mais novos, que ainda estão nos primeiros meses de vida, a febre sozinha pode indicar algo mais grave. “Quanto menor a criança, mais preocupante é a febre. Para esses casos, são necessários diversos exames”, avisa.

O susto veio depois

Quem tem criança em casa sabe bem que a febre pode surgir em momentos nada propícios, como na véspera do aniversário dela, durante um passeio ou no retorno das férias. A que mais recentemente acometeu o pequeno Mairso, de três anos, apareceu logo que a família voltou de uma viagem. “Ele apresentou temperatura de 39º C. Fui medicando com paracetamol e em três dias passou, mas dois dias depois a febre voltou. Como era fim de semana, levei-o ao pronto-socorro”, conta a mãe, a fotógrafa Ana Carolina Barbi.

Ela afirma que, por conta de muitos casos de pneumonia, a médica prescreveu um corticoide para o menino, medicamento que o fez dormir demais, eliminando a febre. Mas o susto ainda estava por vir. Alguns dias após o fim da administração do remédio, o pequeno teve uma mudança brusca de comportamento. “Ele batia, chutava e ficava nervoso o tempo todo. Fiquei desesperada. Levei-o à psicóloga e à neurologista, que foi quem descobriu que se tratava de um efeito colateral do corticoide.”

Como lição, a necessidade de realmente manter a calma diante da febre. “Levá-lo ao pronto-socorro, agora, só em último caso”, diz.

Pânico com convulsão

A história mais estressante que a publicitária Etiene Pedrassolli viveu relacionada a febre infantil aconteceu há dois anos. Ela estava trabalhando quando recebeu uma ligação da babá informando que Américo, hoje com cinco anos, estava com febre. “A babá o medicou, mas ele vomitou e ela não repetiu o procedimento”, diz. Pouco tempo depois, foi o marido que telefonou contando que a babá havia ligado porque o menino estava sem pulso. Desesperado, o casal correu com ele para o hospital.

“Foi a pior situação que já vivi, porque criança com convulsão apaga, fica sem sentido, e nós não sabíamos o que ele tinha”, relata. Passado o susto, exames mostraram que estava tudo normal com Américo. “Ele nunca mais teve convulsão, graças a Deus. Os médicos dizem que isso atinge pequena porcentagem das crianças e ocorre uma única vez.”

Mesmo sabendo que febre não requer desespero, o episódio fez com que Etiene passasse a medicar o filho logo nas primeiras alterações de temperatura. “A febre dele sobe muito rápido e, em pouco tempo, chega a 39,5ºC. Dizem que é preciso identificar a causa da infecção e eu acho importante, mas, pelo que passamos, entro em pânico. Assim que ela aparece, dou dipirona ou paracetamol e acompanho o tempo todo. Quando está altíssima, dou banho para diminuir na hora.”

Quando a febre faz mal

O pediatra Marcelo Conrado dos Reis, que também é presidente do Departamento de Emergência da SPSP, afirma que apenas nas crianças com problemas cardíacos ou pulmonares crônicos e nas que têm convulsão a medicação se faz mais necessária. “Consideramos febre quando o termômetro marca a partir de 38º C e só então deve-se administrar antitérmico”, informa.

Ele esclarece que não é a febre alta que leva à convulsão, mas, sim, a velocidade com que a temperatura sobe. Ainda sobre as convulsões, o especialista destaca que elas podem ocorrer quando a criança tem epilepsia ou com a chamada convulsão febril benigna, provavelmente a mesma que acometeu o pequeno Américo. “Pode acontecer com crianças de cinco meses a cinco anos, geralmente quando há histórico familiar. Ela tem curta duração e, normalmente, não deixa sequelas. Só assusta todo mundo.”

A principal orientação nessa situação é manter a calma. “Coloque a criança de lado, tente esticar o pescoço dela para que respire melhor, chame ajuda (Samu ou Bombeiros) e espere passar. Colocar a criança no carro e sair correndo para o hospital pode causar um acidente e não resolve nada”, orienta. E mesmo aos pais que já passaram pela difícil experiência, o conselho permanece. “A probabilidade de uma segunda convulsão é pequena”, tranquiliza.

Cuidado com a medicação!

Paracetamol, dipirona e ibuprofeno são as principais medicações comercializadas no Brasil para combater a febre. O pediatra Marcelo Reis, da Unicamp, explica que todos são eficientes e não mascaram a doença que causa a elevação da temperatura corporal. “Os três são seguros. Apenas a aspirina é desaconselhada, porque pode aumentar o risco em doenças como a dengue”, diz. Sobre a administração deles às crianças, o especialista dá alguns conselhos:

- Não deixe-os ao alcance das crianças, pois, por terem apresentações doces, podem se tornar atrativos. Em altas doses, no caso do paracetamol e da dipirona, podem causar intoxicação hepática e diminuição da produção de hemáceas e glóbulos brancos.

- Esteja atento para dar à criança a dose correta prescrita pelo médico, respeitando os intervalos.

- Intercalar as medicações é possível, desde que o responsável tenha controle da ordem da administração dos remédios.

- Quando pessoas distintas ficam responsáveis por dar o remédio à criança, é importante anotar para que haver risco de falhas ou superdosagens.

- Não banalize o uso dessas medicações. Todas podem ter efeitos colaterais e riscos de uso.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545