Há muitas questões envolvidas quando se fala em uma segunda opinião, tanto em relação ao paciente quanto em relação ao médico. Sempre é importante buscar entender o que motiva um paciente a ouvir uma segunda opinião.
12/08/2014
É cada vez mais frequente observarmos questionamentos quanto a diagnósticos, exames, tratamentos de pacientes que, após uma nem sempre tão longa pesquisa nos sites fica em dúvida quanto à opinião dos médicos consultados.
Assim, cada vez mais se espalham os blogs, perfis do facebook, sites em que as mães e os pacientes confrontam opiniões de diversos especialistas e embasadas em ...* definem quem está certo e quem está errado.
...* quer dizer que a definição não tem, na maior parte das vezes, embasamento científico.
O que acaba determinando o caminho a seguir, muitas vezes, é a opinião do grupo, em que não há profissionais especializados e que não tem acesso aos recentes estudos sobre qualquer tema.
Respondi uma matéria sobre isso há quase um ano. Como não foi publicado por quem me pediu a matéria, acho oportuno o momento de falar a respeito. Acompanhem-se e ... me dêem sua opinião. Se eu não gostar vou pedir também uma segunda opinião, tá? Rsrs
Essa pergunta pode até ser complementada por outra parecida:
Quando um paciente diz a você que irá atrás de uma segunda opinião (de um outro especialista da sua área) sobre um diagnóstico dado por você, como você reage?
Há muitas questões envolvidas quando se fala em uma segunda opinião, tanto em relação ao paciente quanto em relação ao médico. Sempre é importante buscar entender o que motiva um paciente a ouvir uma segunda opinião. Normalmente, essa situação pode ocorrer, entre outras, quando:
- Não há um bom vínculo de confiança médico-paciente;
- O tratamento proposto, por ser muito intervencionista ou não, gera dúvidas ao paciente;
- O médico que acompanha o caso solicita avaliação de um especialista e indica mais de um profissional de sua confiança para essa segunda (ou até terceira) opinião;
- As informações disponibilizadas na internet (Dr. Google) possibilitam um conhecimento superficial sobre o assunto (procurado pelo próprio paciente que não é da área de saúde) gerando conflitos de informações.
Por outro lado, é importante que o médico compreenda que o paciente tem o direito tanto a esse conflito quanto a ouvir uma segunda opinião.
Vale lembrar alguns artigos do atual sexto Código de Ética Médica, em vigor desde abril 2010, para estabelecer bases da atuação do médico.
Logo na abertura, em seus princípios fundamentais, há 3 artigos que merecem destaque nesse caso:
I - A Medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza.
II - O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.
V - Compete ao médico aprimorar continuamente seus conhecimentos e usar o melhor do progresso científico em benefício do paciente.
Em sua relação com o paciente, nesse mesmo capítulo:
XXI - No processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com seus ditames de consciência e as previsões legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas.
E no capítulo IV, sobre Direito Humanos:
É vedado ao médico:
Art. 24. Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo.
E na sua relação com os seus colegas de profissão:
XVII - As relações do médico com os demais profissionais devem basear-se no respeito mútuo, na liberdade e na independência de cada um, buscando sempre o interesse e o bem-estar do paciente.
XVIII - O médico terá, para com os colegas, respeito, consideração e solidariedade, sem se eximir de denunciar atos que contrariem os postulados éticos.
Assim, o conhecimento médico é tão importante quanto o vínculo médico –paciente e o relacionamento do médico com seus colegas para que, ao final, o objetivo principal da Medicina seja cumprido:
A única e elevada missão do médico é a de restabelecer a saúde dos pacientes, ou seja, curá-los das suas enfermidades (Samuel Hahnemann, Organon da Arte de Curar. 1810).
Finalizando ainda com o Código de Ética Médica, em seu capítulo V (Relação com Pacientes e Familiares):
É vedado ao médico:
Art. 31. Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte.
Art. 39 Opor-se à realização de junta médica ou segunda opinião solicitada pelo paciente ou por seu representante legal.
Dessa forma, sempre que o paciente quiser ouvir uma segunda opinião, é importante que o médico se abstenha da vaidade pessoal, que ele entenda que, na maior parte das vezes, exceto quando não se estabeleceu um vínculo de confiança, a questão envolvida não é pessoal e sim uma busca, justa e ética, pelo caminho que o paciente julgar o melhor para o restabelecimento de sua saúde.
Como na maior parte das situações em nossas vidas, há prós e contras a tomada de uma segunda opinião.
Uma vez que o intuito do médico seja oferecer um acompanhamento ético, baseado em seu constante aperfeiçoamento profissional, tendo os cuidados de não privar seu paciente de todas as possibilidades de cuidado de sua saúde, a segunda opinião pode ser encarada até como uma oportunidade de estabelecer um maior vínculo de confiança com seu paciente.
O médico tem o direito e a obrigação de informar seu paciente sobre todos os dados de sua patologia e orientá-lo da melhor forma possível, independente de ele buscar ou não uma segunda opinião.
Nem sempre dois médicos terão a mesma opinião sobre um assunto. Isso pode gerar até mais desconfiança e dúvidas no paciente, fato que o fará buscar uma terceira ou até mais outras opiniões, retardando, eventualmente, o início de um tratamento. Essa atitude pode até ser prejudicial ao sucesso da proposta terapêutica. Assim, a tomada dessas opiniões deve ser rápida para que uma decisão seja tomada dentro de um prazo seguro na direção e um tratamento.
Outra possibilidade é a de que o paciente, temerário de um tratamento mais agressivo, mesmo que adequado (cirurgia, quimioterapia, por exemplo) procure uma opinião que o “proteja” em sua ansiedade, por conta do diagnóstico e prognóstico mais graves. Mesmo nesses casos, esse é um direito do paciente, mas se houver risco iminente de morte (capítulo V, artigo 31), é obrigação do médico alertar seu paciente sobre o assunto (ou seu representante legal, quando a comunicação direta possa lhe provocar dano – capítulo V, artigo. 34)
Seguindo as orientações éticas e pela forma de trabalho que sempre adotei, considero a informação uma das mais importantes “missões” do médico. Até por isso e pelo vínculo médico-paciente que buscamos manter em nosso atendimento diário, essas confrontações acontecem no dia-a-dia da clínica e nos permitem esclarecer as dúvidas dos pacientes.
A atualização constante através da participação em cursos, congressos, o acesso a artigos recentes publicados permite que tenhamos condições de oferecer essa informação de forma correta, simplificada, baseada em evidências aos nossos pacientes. E dessa forma, essas dúvidas de nossos pacientes passam a ser vistas mais como um estímulo ao aperfeiçoamento à educação continuada do que como um questionamento sobre a correção do diagnóstico.
Possivelmente, a grande maioria dos médicos já teve seus diagnósticos e condutas pelo menos questionados por conta das informações da web.
Costumo dizer que atualmente o Dr. Google tem sido um de nossos maiores “concorrentes” com alguns agravantes:
- Ele não tem consultório, telefone de contato e não responde e-mails;
- Ele não atende aos pacientes e nem os examina;
- Suas informações não têm limites éticos, não são claras e permitem, em grande parte das vezes, que cada um tire suas conclusões sem um embasamento científico adequado.
Vejo a divulgação, mesmo através do Dr. Google, como um benefício à população, desde que não se tome nenhuma atitude intempestiva baseada apenas nessas informações.
O Dr. Google, entre outras fontes não oficiais de informação, nos permite como médicos a possibilidade de esclarecimento do paciente nos assuntos mais comuns do dia-a-dia da saúde.
Outra consequência é a necessidade de uma atualização mais constante dos médicos para que haja um maior embasamento para esclarecimentos nessas situações.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545