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Amamentar em público: por que tanta polêmica?

Do blog Jornal da Mulher

O aleitamento materno em público é bom para a mãe e a criança, enquanto “os mamaços” (como forma de protesto) na frente das lojas e das empresas podem não ser assim tão bons para os negócios

por Márcia Wirth

24/04/2015

Amamentar em público tem sido tema de um debate global sobre os direitos das mães e bebês x “o bom comportamento público”, ao longo de décadas. Recentemente, no dia 14 de abril, o prefeito de São Paulo, sancionou uma lei que assegura o aleitamento materno em qualquer estabelecimento de São Paulo.

“Todo estabelecimento localizado no Município de São Paulo deve permitir o aleitamento materno em seu interior, independentemente da existência de áreas segregadas para tal fim.  Para fins desta lei, estabelecimento é um local, que pode ser fechado ou aberto, destinado à atividade de comércio, cultural, recreativa ou prestação de serviço público ou privado”, de acordo com o texto. Segundo os vereadores, autores da lei, a motivação para a norma veio de um episódio ocorrido no SESC Belenzinho, na Zona Leste, em 2013, quando uma mãe foi constrangida por amamentar nas dependências do SESC.

“A cidade de São Paulo deve se orgulhar da sanção dessa lei. Pouco a pouco, mães que tiveram sua dignidade ofendida por amamentar em público têm aprendido a reagir. Elas encontraram nas redes sociais canais apropriados para extravasarem suas emoções e compartilharem suas vitórias e conquistas.  Acompanho há algum tempo as discussões de grupos virtuais   e a discriminação por amamentar em público é um tema recorrente entre as participantes. Eu mesmo participei do evento de desagravo no SESC Belenzinho, no ano passado, que deu origem à lei. No entanto, precisamos ter em mente outros três aspectos fundamentais dessa discussão: o cumprimento/fiscalização dessa lei na cidade de São Paulo, a falta de legislação específica em outros municípios e estados e o preconceito em relação à amamentação em público”, afirma o pediatra e homeopataMoises Chencinski (CRM-SP 36.349).

 

É proibido mamar?

Em mais de três décadas de prática médica, o médico conta que a censura em relação à amamentação em público é recorrente. “Por isso, fiz deste um tema de relevância no meu blog #euapoioleitematerno. As mães relatam diariamente, pessoalmente e virtualmente, diversas formas de intimidação em relação ao ato de amamentar em público: olhar com cara estranha, sugerir para a mãe que se cubra ao amamentar, indicar ‘locais apropriados’ para a amamentação, olhares de repúdio das pessoas por verem uma mãe amamentando um filho em público...”, conta Moises Chencinski.

O médico há três anos destaca o tema no seu blog #euapoioleitematerno, mencionando histórias ocorridas no Brasil e no mundo. “Quando mães e bebês são intimidados, humilhados e constrangidos, procuramos abordar o fato, exatamente para destacar o absurdo da situação. Por exemplo, o simples fato de uma empresa solicitar que uma mãe amamente de uma maneira X ou Y, para se adequar às necessidades da instituição, está errado, é bullying. As empresas precisam investir na capacitação de seus funcionários em relação às suas próprias políticas de aleitamento materno e às leis vigentes”, diz.

Confira alguns textos já publicados no blog #euapoioleitematerno

1.      Fotógrafa comemora o aleitamento materno, apesar dos inimigos virtuais…;

2.      Amamentar em público ainda gera polêmica;

3.      Canção para todas as mulheres que já amamentaram em público…;

4.      Londres tem café especializado em amamentação, você sabia?;

5.      Papa Francisco defende (outra vez) o aleitamento materno em público;

6.      Fotos que mostram como realmente é bonito amamentar;

7.      Um bebê com fome não pode esperar: compreender isso pode até impulsionar os negócios;

8.      Locais que fazem mais que apoiar o aleitamento materno;

9.      Quando você proíbe uma mãe de amamentar em público…;

10.   Mulheres realizam mamaço no MIS após mãe ser proibida de amamentar;

11.   Segredo da amamentação: Victoria’s Secret não aprecia seios à mostra;

12.   É proibido mamar…;

13.   Se você não apoia a amamentação em público, você não apoia o aleitamento materno;

14.   Mães realizam “mamaço” em protesto;

15.   Você tem vergonha de amamentar seu filho em público?

Fiscalização/cumprimento da lei paulistana

“Ao ler com atenção a lei sancionada pelo prefeito de São Paulo, o cidadão percebe que cabe ao ‘Poder Executivo regulamentar no que couber a presente lei no prazo de 90 (noventa) dias, a contar da data de sua publicação’. Ou seja, ainda esperamos a regulamentação da lei, que definirá a fiscalização, o cumprimento e a aplicação da multa. É preciso cobrar esta atitude do prefeito Fernando Haddad, visando a proteção dos direitos de mães e dos bebês”, defende o médico, autor do blog #euapoioleitematerno.

Falta de legislação nos demais municípios

“Como amamentar é um direito, não devíamos nos contentar com a aprovação dessa lei apenas na cidade de São Paulo. E nos demais municípios paulistas? E nos demais estados brasileiros? Devemos e precisamos pensar grande nesse sentido”, diz o pediatra.

Muitas organizações encaram a conveniência de uma mãe alimentar uma criança em um local público como um incômodo ou uma perturbação da ordem do dia. Mas amamentar em público é uma prática legal, não é um crime ou uma contravenção.
A visão de uma mulher amamentando seu filho em público pode ser ofensiva para alguns. Nos Emirados Árabes, é lei que as mães amamentem seus filhos durante dois anos, mas elas não podem fazer isso em público. A amamentação em público é protegida no Reino Unido através da Lei de Igualdade de 2010. Nos Estados Unidos, quase todos os 50 estados aprovaram legislação que protege as mulheres de serem processadas ​​por amamentar em público, menos Idaho e Dakota do Sul, onde ainda há leis que proíbem a prática.

 

Sobre amamentação em público, veja também:  https://youtu.be/OgOmrhcNzQM

Combate ao preconceito

Na linha do combate ao preconceito à amamentação em público, mães, “não mães”, celebridades, “não celebridades”, profissionais de saúde e até mesmo o Papa Francisco já vieram a público saudar e defender o aleitamento materno.

“No entanto, muitas vezes, este importante tema de saúde pública é retratado apenas como um problema social das mulheres. O que é menos conhecido é a biologia que impulsiona o aleitamento materno. A mãe que está amamentando vai produzir leite em intervalos regulares como uma consequência direta dos hormônios controlados pela alimentação infantil. Assim como um bebê com fome precisa ser alimentado, uma mulher que amamenta precisa dar de mamar. As duas necessidades juntas devem ser vistas como uma necessidade biológica simbiótica, como algo que não é realmente uma escolha. E também não é voluntário”, explica Moises Chencinski.

O médico destaca que atrasar a alimentação do bebê com fome acarreta nas consequências óbvias de fome e mau humor para a criança, mas também pode representar riscos de saúde para a mãe, como ingurgitamento mamário, dutos obstruídos e uma infecção chamada mastite. “A oferta de leite materno também pode diminuir, levando ao desmame precoce. Esses resultados têm custos mais elevados”, alerta o pediatra.

Se as crianças dos Estados Unidos fossem amamentadas exclusivamente por seis meses, cerca de 13 bilhões de dólares em cuidados de saúde seriam poupados anualmente, de acordo com os dados do the U.S. Surgeon General.
De acordo com a UNICEF, o aumento da prática da amamentação, em muitos países, resultou em 39% de todas as crianças do mundo em aleitamento materno exclusivo até os seis meses de idade. A amamentação tem o maior impacto sobre a sobrevivência de uma criança e pode evitar mais de 800.000 mortes de crianças por ano no mundo em desenvolvimento.
No entanto, o tempo que uma mãe amamenta continua a ser pequeno. Menos de 16% das novas mães que começam a amamentar seus recém-nascidos consegue manter o aleitamento até que a criança atinja seis meses de idade.

Amamentação em público x imagem das empresas

“A amamentação não é apenas importante para a saúde, mas também para a economia. Lojas, empresas e negócios precisam reconhecer a necessidade do aleitamento materno. As mulheres controlam 20 trilhões de dólares dos gastos dos consumidores em todo o mundo e representam 80% dos gastos dos EUA e 65% da despesa global, de acordo com o Banco Mundial. Milhões de mulheres nesse imenso contingente podem estar amamentando”, afirma o médico.

Além dos benefícios para a saúde e da necessidade fisiológica de alimentar uma criança com fome, acomodar as mães que amamentam, em vez de expulsá-las, pode impulsionar as vendas, bem como conquistar a fidelidade do consumidor. “Enquanto muitos vão argumentar que o aleitamento materno em público é bom para a mãe e a criança, particularmente, considero que os mamaços (como forma de protesto) na frente das lojas e das empresas podem não ser assim tão bons para os negócios”, defende Chencinski.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545