Do blog Pediatra Orienta
Relator:
Dr. Yechiel Moises Chencinski
Departamento Científico de Pediatria Ambulatorial e Cuidados Primários
14/12/2015
Não é de agora que se conhecem as dificuldades de controlar o mosquito Aedes aepypti e os riscos que corremos caso esse controle não seja atingido.
Segundo dados do Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde (2015), houve uma altíssima incidência de dengue, uma doença provocada por vírus transmitido pelo Aedes aepypti, e que mata. Entre 4 de janeiro e 14 de novembro no Brasil, houve o recorde, desde 1990, com 1.534.932 casos prováveis da doença e 811 mortes por dengue confirmadas (79% a mais do que o mesmo período de 2.014), sendo esse, também, o recorde de óbitos. Mesmo isso não foi o suficiente para alertar a população, a sociedade e o governo a respeito de uma atitude mais firme contra a doença e o mosquito transmissor.
A febre de chikungunya, transmitida pelo mesmo mosquito teve, até novembro de 2015, mais de 8.900 casos em investigação e mais de 6.700 casos já confirmados. Ainda assim, a movimentação não foi suficiente para estancar o crescimento das estatísticas da doença e a proliferação do mosquito.
Agora estamos diante de uma nova e real ameaça – o zika vírus. Até o momento, mais de 1.700 casos suspeitos de microcefalia foram identificados em torno de 400 municípios brasileiros. Esses casos podem estar relacionados à picada do Aedes aegypti durante a gestação. Assim como nas outras doenças virais transmitidas pelo mesmo mosquito (dengue, febre chikungunya), acredita-se que cerca de 80% das pessoas contaminadas pelo zika vírus não apresentam qualquer sintoma, o que não quer dizer que as consequências da infecção (microcefalia nos bebês dessas gestantes, por exemplo) não ocorram.
Assim, antes de qualquer atitude e antes de sairmos espalhando o terror e informações irresponsáveis, mais uma vez, o fundamental é a INFORMAÇÃO. E só através da INFORMAÇÂO poderemos ter uma AÇÃO eficaz e consciente.
Não acreditem em milagres
É fundamental que toda e qualquer atitude ou medida em relação ao panorama atual de dengue, zika vírus e febre chikungunya e ao do Aedes aegypti tenha comprovação e embasamento científicos reconhecidos por instituições idôneas (como Ministério da Saúde, Associações Médicas, FIOCRUZ, OMS etc.). Sempre que receber alguma informação, antes de espalhar as notícias pelas redes sociais, cheque suas fontes. Algumas informações veiculadas na mídia requerem atenção por serem inverdades ou não terem comprovação científica.
Leia abaixo alguns exemplos das principais dúvidas e mitos sobre este assunto:
A FIOCRUZ informa que ainda não há dados estatísticos que permitem tal afirmação para qualquer faixa etária. A síndrome de Guillain-Barré pode ter várias causas e sua relação com o zica vírus ainda não está esclarecida.
A FIOCRUZ também informa que, quanto ao vetor, até o momento, não existem estudos científicos que apontem para o envolvimento de outras espécies de mosquitos além do Aedes aegypti na transmissão da doença no Brasil. O Aedes albopictus, também existente no Brasil, apesar de não haver nenhum registro de exemplares adultos infectados com o vírus da dengue, chikungunya ou zica vírus no País, é alvo de estudos que monitoram o crescimento de sua população e investigam seus aspectos em comparação aos do Aedes aegypti.
Não existe qualquer estudo conclusivo que comprove a ação da homeopatia em pacientes com qualquer uma dessas doenças, especialmente em febre do chikungunya e zika vírus, que são doenças muito recentes em nosso meio. As fórmulas homeopáticas não curam e nem previnem a dengue. Quanto aos “complexos homeopáticos contra dengue”, há muitas fórmulas diferentes prescritas para essa finalidade. A homeopatia se caracteriza pela individualização do paciente e não da doença.
Não existe qualquer estudo que comprove essa ação da homeopatia. Aliás, o tratamento homeopático não é realizado com essa intenção. O tratamento homeopático se baseia nos sintomas do paciente e não se propõe a afastar insetos, vírus ou bactérias. Portanto não deve ser usado na esperança de que, ao ser picado por um Aedes aegypti transmissor do vírus, a pessoa não adoeça.
A ANVISA não reconhece nenhum desses produtos e não existe nenhum estudo que comprove a eficácia e a proteção prometidas (veja o texto Evitando Picadas de Insetos que aborda as questões relativas a roupas adequadas, repelentes e inseticidas).
Essas informações foram divulgadas por muito tempo e com grande utilização, mas sem eficácia comprovada. No site Invivo, da FIOCRUZ, há uma recomendação a respeito: “O que atrai a fêmea do mosquito para o corpo humano é o cheiro. Por isso, qualquer produto que ingerimos, quando eliminado do organismo, confunde a fêmea, já que modifica nosso cheiro. Mas cuidado! Essas substâncias precisam ser consumidas em grandes quantidades para que a eliminação chegue a confundir o mosquito. Inhame em grande quantidade não faz tão bem ao organismo, complexo B em excesso causa toxidez e o alho, bom… o alho traz aquele mau hálito.”.
De acordo com documento recente da Sociedade Brasileira de Pediatria (veja aqui) sobre o uso de repelentes de insetos em crianças, “abaixo de 6 meses – não há estudos nessa faixa etária sobre segurança dos repelentes e extrapola-se o uso dos recomendados para bebês acima de 6 meses em caso de exposição inevitável e com orientação médica.” Esse mesmo documento indica os repelentes que estão disponíveis no Brasil, regularizados pela ANVISA, inclusive com seus nomes comerciais. A Sociedade Brasileira de Pediatria (em outro informe) e a Sociedade de Pediatria de São Paulo (Evitando Picadas de Insetos) orientam quanto aos cuidados que podem e os que não devem ser tomados na prevenção às picadas de insetos.
A ANVISA e o Ministério da Saúde não apresentam restrições ao uso de repelentes em gestantes. Ao contrário, a aplicação desses produtos, bem como outras medidas no combate ao mosquito, é recomendada e orientada em vários informes das instituições, atestando sua segurança nessa faixa de risco da população.
A vacina, que ainda está aguardando o registro da ANVISA (já aprovada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), e já foi liberada no México (primeiro país a utilizar a vacina), apresenta níveis parciais de proteção contra os 4 tipos de vírus causadores de dengue, mas, de forma alguma, os cuidados adequados de combate à proliferação do mosquito devem ser abandonados. No blog do Ministério da Saúde há um alerta importantíssimo: “As larvas do mosquito não se desenvolvem apenas em água limpa – os ovos do mosquito também podem se desenvolver em água suja e parada. Para combater a dengue, o importante é acabar com qualquer reservatório de água parada, seja limpa ou suja”.
Esse é outro mito perigoso. O blog do Ministério da Saúde diz: “Os repelentes não têm um efeito eficaz no controle do mosquito. O certo é evitar acumular água parada, fazer soluções à base de água sanitária. Colocar areia nos pratinhos dos vasos é o melhor meio para evitar o ciclo de reprodução do Aedes aegypti.”.
Na Polinésia Francesa (onde houve surto de zika em 2013), médicos encontraram partículas do vírus no leite materno. Mas ainda não se sabe se existe transmissão para o bebê porque nem todo vírus encontrado no leite é transmitido. Essa questão remete ao mesmo tipo de situação de mães portadoras de hepatite C, em que os investigadores concluíram que o aleitamento materno não apresenta risco para transmissão do vírus. É orientação do Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) do Estado de São Paulo não suspender o aleitamento materno quando a mãe é portadora do vírus da hepatite C sem infecção associada com HIV, com orientação sobre o possível risco de transmissão se houver fissura nos mamilos com presença de sangue. Segundo dados do CDC, a transmissão raramente ocorre de mãe para filho. Ainda de acordo com esse documento, “até agora, não há relatos de crianças infectadas pelo zika vírus através da amamentação. Pelos benefícios do aleitamento, mães devem ser encorajadas a amamentar mesmo em áreas onde o zika vírus for encontrado”.
Essa é uma informação recente, divulgada de forma irresponsável através das redes sociais. A Síndrome da rubéola congênita, quando afeta a gestante, pode trazer malformações, entre elas a microcefalia (retardo no crescimento intrauterino – 43%, anormalidades viscerais – 50 a 75%, microcefalia – 39%, manifestações cutâneas -20 a 50% e microftalmia – 20%). No dia 2 de dezembro, o Brasil recebeu um certificado da Organização Mundial de Saúde, considerando a rubéola e a síndrome da rubéola congênita, oficialmente, eliminadas no país (últimos casos de transmissão no país em 2008 e 2009,). O calendário nacional de vacinação prevê que a vacina da rubéola deve ser aplicada aos 12 e 15 meses, (dentro da tríplice viral – sarampo, caxumba e rubéola). Ela é uma vacina produzida com vírus vivos e atenuados, que não são capazes de provocar as três doenças. É possível tomar essa vacina em outros momentos da vida, mas nunca durante a gestação. A vacina contra a rubéola é especialmente indicada para mulheres em idade fértil – entre 15 e 29 anos – para evitar pegar a doença durante a gravidez. As mulheres grávidas que não foram vacinadas antes da gestação devem receber a vacina somente após o parto.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545