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O consentimento informado deve ser visto como uma parte essencial da prática médica; a permissão dos pais e o assentimento da criança é um processo que engaja pacientes, adultos e crianças, nos cuidados de saúde
por Márcia Wirth
17/01/2018
É comum na prática pediátrica examinar crianças pequenas e tratá-las “contra a sua vontade”. Ao limpar a cera do ouvido, por exemplo, para ver se há uma infecção, o pediatra não pede a opinião da criança.
Mas, à medida que elas crescem, como podem e como devem começar a participar da tomada de decisões médicas? E se eles discordarem de seus pais ou de seus médicos? Quando eles começam a decidir se querem fazer uma cirurgia eletiva ou se desejam tomar a medicação para o transtorno de déficit de atenção, se querem ser submetidos a exames médicos ou tratamentos ou apenas desejam esperar para ver se seus sintomas desaparecem por conta própria?
A Academia Americana de Pediatria divulgou uma nova política sobre o consentimento informado, com um relatório técnico, que acompanha o documento, analisando a questão do consentimento informado por pacientes pediátricos. “O documento discute a questão do consentimento informado formal, mas também a questão do assentimento, sugerindo que mesmo uma criança de 7 anos de idade pode expressar concordância com o tratamento médico proposto e que, se a criança for adequadamente informada e envolvida na discussão, isso pode ‘promover o crescimento moral e o desenvolvimento da autonomia em pacientes jovens’”, afirma o pediatra e homeopata Moises Chencinski (CRM-SP 36.349).
Os novos documentos foram norteados pelo entendimento do neurodesenvolvimento e da evolução da habilidade de tomada de decisão pelos adolescentes. “O objetivo do assentimento pediátrico, do ponto de vista do neurodesenvolvimento, é promover as habilidades de tomada de decisão e construir um crescente senso de autonomia, à medida que a criança envelhece, de modo que, quando atingirem a autonomia dos adultos, elas entenderão a complexidade da decisão médica, estando preparadas para assumi-las”, explica o pediatra, que é membro do Departamento de Pediatria Ambulatorial e Cuidados Primários da Sociedade de Pediatria de São Paulo.
Aviva Katz, cirurgião pediátrico que é o diretor do Serviço de Consulta Ética do Hospital Infantil de Pittsburgh, é o autor de ambos os documentos. Katz defende o seguinte ponto de vista: "você não espera que um adolescente dirija bem aos 18 anos sem horas de treinamento. Por que você esperaria que alguém tomasse decisões médicas complexas, com 19 anos, se nunca teve uma chance de tomá-la em um ambiente mais seguro?".
Poder de decidir
Segundo as novas diretrizes, quando os assuntos são mais complexos (doenças fatais, onde recusar o tratamento pode ter consequências mortais), a criança não vai ser autorizada a opinar, é importante deixar isso claro.
“O assentimento é reconhecer que a criança é sujeito ativo de seu tratamento. Mas acolhê-la não significa concordar com todas as suas decisões. O pediatra deve se esforçar para explicar o tratamento e sua importância, mas a última palavra não é da criança”, esclarece o médico.
Os adultos são autorizados a recusar tratamentos ou cirurgias que salvam vidas e a ignorar os conselhos de seus médicos. Mas eles não são geralmente autorizados a fazer isso em nome de seus filhos, e há uma abundância de precedentes legais para anular as preferências religiosas, ordenando as transfusões de sangue ou a aplicação de medicamentos, mesmo que os pais recusem o tratamento.
“Tomar decisões médicas complexas, e tomá-las bem, significa lidar com informações sobre sua doença, sobre as terapias, sobre os riscos, benefícios e efeitos colaterais”, diz Chencinski. O Canadá não tem uma idade formal para o consentimento médico, ele e depende, em vez disso, da capacidade do paciente. Em um estudo, publicado em 2011, pesquisadores canadenses deram aos adolescentes (de 12 a 16 anos) e a seus pais informações sobre o tratamento para o transtorno de déficit de atenção - o tipo de informação que um paciente precisa entender para dar o consentimento informado. Quando testaram a compreensão e a recordação dos fatos, os adolescentes se saíram tão bem quanto seus pais.
“Claramente, uma estratégia medicamentosa é muito mais provável de ser bem sucedida se o adolescente compra a ideia e coopera com o tratamento. Incluindo o paciente na discussão, a decisão dele pode ajudar o tratamento. Há estudos que mostram que muitos pediatras falam diretamente com o pai e não envolvem a criança nesse processo. Se cultivarmos a prática de incluir as crianças nas conversas médicas, os adultos jovens terão mais experiência e estarão mais aptos a tomar parte das decisões”, defende o pediatra.
A nova declaração de política reconhece várias situações em que os adolescentes são legalmente capazes de tomar decisões médicas por si próprios, incluindo o consentimento para o tratamento de questões relacionadas com a saúde sexual, contracepção e cuidados pré-natais, bem como para a saúde mental e abuso de substâncias. A justificativa para dar aos adolescentes essa autonomia médica adicional baseia-se na preocupação de que não receberão tratamento se tiverem que ter o consentimento dos pais.
Moises Chencinski defende que mesmo nos casos em que os pais têm o poder de decisão, “ainda assim é importante envolver o paciente pediátrico, dando às crianças um pouco mais de liberdade do que o habitual, mas isso pode ser difícil e assustador para os pais”, diz.
As novas diretrizes incentivam que os pediatras invistam tempo e incluam as crianças nas conversas, mas os médicos também devem se lembrar que mesmo as que têm fortes habilidades cognitivas não necessariamente têm um julgamento maduro das situações. “É melhor fazer esse processo em etapas, dando às crianças a oportunidade de começar a tomar decisões médicas, para que comecem a ser parte dessa discussão”, diz o médico.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545