Do portal Papo de Mãe - UOL
O pediatra Moises Chencinski explica como o leite materno diminui os riscos de doenças e favorece o desenvolvimento das crianças
por Dr. Moises Chencinski - colunista
30/05/2022
Se você tomar sol, desde a infância, sem a proteção devida (protetor solar, horários mais adequados), você corre grande risco de câncer de pele quando adulto.
Se você fumar cigarros, ou conviver em ambientes onde muitas pessoas fumam (fumante passivo) por muito tempo, você terá um risco aumentado de câncer de pulmão e outros tipos também.
Se, desde criança, você não tiver uma alimentação adequada, e abusar dos ultraprocessados (salgadinhos, biscoitos, frituras, salsicha, refrigerantes, sucos industrializados), você terá um risco maior de quadros como diabetes, problemas de colesterol e obesidade já na própria infância.
Ou seja, quanto mais você se expõe a fatores perigosos, sem proteção, por um tempo mais prolongado, maior é o risco de você ter problemas graves na sua saúde, e, em grande parte das vezes, mesmo que interrompa sua exposição.
Até aqui, tudo bem? Acho que ficou claro.
E dá pra usar isso para o bem?
Vamos para o leite materno (LM)? De novo????? Ah, para...
O LM é considerado o padrão ouro da alimentação infantil, recomendado desde a sala de parto até dois anos ou mais, sendo exclusivo até o 6º mês de vida.
Quais as razões para tamanha insistência pelo LM? As crianças que não mamam LM, ou que fazem aleitamento misto, ou que não atingem os marcos planejados pela OMS vão adoecer mais, se desenvolver menos do que as que conseguem atingir as metas?
Não dá para garantir isso. Mas os riscos aumentam para os bebês e suas mães. Segundo dados de pesquisas publicadas, sem a amamentação adequada, podem ocorrer 20.000 mortes maternas (câncer de mama, de colo de útero, de ovário, entre outras), 823.000 mortes de crianças abaixo de 5 anos de idade (diarreias, infecções respiratórias) e um gasto mundial de 302 bilhões de dólares por ano.
Então, vamos novamente para a ciência, a tão maltratada e desacreditada ciência. Eu ainda sou fã incondicional e não consigo me imaginar médico sem a ciência.
O LM é o leite da espécie. Sua composição é a mais completa e equilibrada para o lactente, com mais de 1.000 componentes conhecidos (nutrientes, sais minerais), em um equilíbrio perfeito. Por isso, sua digestão é mais fácil, com menor produção de gases, menos cólicas e menos quadros de refluxo.
Pela presença de anticorpos, inclusive os produzidos pela mãe vacinada durante a gestação ou período de amamentação, e outros elementos de defesa, o leite materno favorece a imunidade do lactente, que se completaria apenas por volta dos 3 anos de idade.
Vamos falar difícil? Mas eu explico.
Existem dois conceitos não muito difundidos para o público, que podem explicar algumas das informações contidas em estudos científicos relacionados ao LM:
Programming (programação) metabólica e “imprinting” metabólico.
Você já observou que de uns 10 anos para cá, mesmo quem não tem sobrepeso ou obesidade, ou quem não se alimenta mal, pode ter problemas de aumento de colesterol ou diabetes? Por que será que isso acontece? Sinal dos tempos? Destino? Azar?
Lembra dos riscos que tanto reforçamos acima? Dois dos períodos mais sensíveis e influenciáveis na nossa vida são gestação e amamentação. Situações que a gestante ou lactante vivenciam (boas ou ruins) podem gerar efeitos imediatos e em muito longo prazo (bons ou ruins).
Todos temos o gene do colesterol no nosso corpo. Dependendo do que você “come” esse gene pode ser ativado ou inibido. Isso quer dizer que você pode “programar” o metabolismo (programming) de um lactente e “gravar” informações (imprinting) positivas nas suas células nessa fase que, com o crescimento e o desenvolvimento, vão proteger contra possíveis riscos de adoecimento no futuro e promover mais saúde, em todos os sentidos.
E é isso o que o LM faz. Grande parte dos seus 1.000 componentes, que não são encontrados em seus substitutos (fórmulas infantis, compostos lácteos e leite de vaca), promovem um funcionamento positivo dos genes, das células e dos órgãos nessa fase, que vão diminuir os riscos à saúde e favorecer o bom crescimento e desenvolvimento dos órgãos.
E essa é a base que justifica que quanto maior o tempo de aleitamento materno exclusivo, os benefícios aparecem e duram por mais tempo. Isso vale, por exemplo, para os estudos publicados sobre a prevenção de asma, entre 4 e 6 anos e o aumento da “inteligência” aos 7, 11 e 14 anos e sua associação com maiores tempos de amamentação.
Então, a ciência mostra e comprova quais as razões pelas quais vale a pena investir mais na ideia e na prática do LM, para diminuir os riscos à saúde. Sem julgamento e sem culpa. Só ciência.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545