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E do “Ponto de Vista” da amamentação...

Do site da Crescer

"Não é nossa 'missão' escolher pela mãe. Sem pressão. Não é nosso 'direito' concordar com ou discordar da sua escolha. Sem julgamento", ressalta o pediatra Moises Chencinski sobre o aleitamento materno

por Dr. Moises Chencinski - colunista

20/02/2023

Do ponto de vista da terra quem gira é o sol
Do ponto de vista da mãe todo filho é bonito
Do ponto de vista do ponto o círculo é infinito
Do ponto de vista do cego sirene é farol

Do ponto de vista do mar quem balança é a praia
Do ponto de vista da vida um dia é pouco
Guardado no bolso do louco
Há sempre um pedaço de Deus
Respeite meus pontos de vista
Que eu respeito os teus

Às vezes o ponto de vista tem certa miopia,
Pois enxerga diferente do que a gente gostaria
Não é preciso por lente nem óculos de grau
Tampouco que exista somente
Um ponto de vista igual

O jeito é manter o respeito e ponto final.

“Ponto de Vista” é uma música que eu ouvi na interpretação do Casuarina, grupo de samba cuja origem (em 2001) e ascensão estão associadas à revitalização da Lapa – bairro da região central da cidade do Rio de Janeiro (RJ). 

Cada frase dessa letra cabe na vida de cada um de nós, e de todos nós, em algum momento. Vamos e convenhamos, quem é que nunca teve um “ponto de vista”? Afinal, isso faz parte da democracia, do livre-pensar, sem opressão, sem interferências externas nas nossas escolhas.

E como viver em um mundo com mais de 8 bilhões de pessoas, cada uma com sua liberdade de pensar e agir de acordo com sua própria consciência, sem nenhuma restrição?

E se cada uma dessas pessoas busca informações para se embasar nas plataformas da internet, com o Google como o “Oráculo”, e tem acesso a mais de 4 bilhões de páginas (segundo estimativas não oficiais) que aumentam a cada segundo?

Mas, “às vezes o ponto de vista tem certa miopia, pois enxerga diferente do que a gente gostaria”. Daí se percebe a importância da informação, da ciência, da ética, da moral, da cidadania, do cuidado com o outro, da visão do todo e de certos “combinados”.

O jeito é manter o respeito e ponto final.”


A vida é feita de poucas certezas e muitos dar-se um jeito

Essa frase, atribuída a Guimarães Rosa, nos coloca em uma posição de constante questionamento. Percebi, no meu último artigo aqui para a Crescer, que preciso “dar um jeito” e corrigir o rumo das minhas informações e opiniões.

Escrevo para mães que amamentam ou desejam amamentar. Além disso, em grande parte dos artigos, eu reforço o respeito às mães que não podem, não conseguem, não gostam ou até não querem amamentar. Sabe quem eu estou deixando de lado? As mães que estão em dúvida, que ainda não têm a certeza se querem ou não, se gostam ou não, se vão ou não amamentar. E acreditem. Esse grupo é tão relevante e tão importante quanto os outros dois. E, talvez, quando elas se decidem, elas tentam “dar um jeito” na situação.

As dúvidas não devem ser menosprezadas. As respostas precisam delas para que o caminho seja o mais adequado possível. E tudo começa na dúvida, mesmo nas de quem tem tanta certeza. E aí, funciona como em uma eleição, em que cada “candidato” tenta convencer o eleitor indeciso da sua verdade.

Para Paulo Freire (sempre Paulo Freire), “uma das condições necessárias a pensar certo é não estarmos demasiado certos de nossas certezas.”

E vamos falar de aconselhamento sempre. Não tem como... É a base. Vejam esse texto (o mesmo) de 2.004.

Durante a gestação, a mulher encontra-se numa situação diferente da habitual, com suas dúvidas, insegurança e medo. Isso a torna mais sensível e suscetível frente às pressões de familiares, profissionais de saúde e amigos quanto à sua capacidade de amamentar. Além disso, a mãe pode estar em conflito consigo mesma sobre a decisão de amamentar. Nesse contexto, a mãe pode facilmente perder sua confiança e autoestima e estar muito propensa a oferecer mamadeira ao seu bebê.”


E qual a base dessas dúvidas?

Escuta ativa
É preciso escutar todas as gestantes, desde a consulta pré-natal, hoje a partir da 32ª semana de gestação. Penso que o pré-natal pediátrico deve começar logo após a primeira consulta com o obstetra e mais uma a cada trimestre. Certamente, ela deve ter algo a dizer. Ela precisa de alguém que queira escutar.

Só assim, dá pra saber que ela “vem de uma família que não amamenta muito”, “tem que voltar logo ao trabalho”, “tem outros filhos que pedem sua atenção”, “precisa ter condições de dormir e que acha que a mamadeira dará essa possibilidade mais real”. Mas, tudo em uma escuta respeitosa.

Empatia
Ser empático é ver o mundo com os olhos do outro e não ver o nosso mundo refletido nos olhos dele (Carl Rogers – psicólogo). Depois de toda a escuta, antes de tentar “resolver os problemas da mãe” ou dar “as dicas que vão mudar a vida dela”, é preciso entender o que ela realmente deseja de fato nesse contato. Pode até ser “só” ser ouvida (o que já é muito).

O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: ‘Se eu fosse você’ ...” (Rubem Alves, de novo).

Sem julgamento
Escutou? Empatizou? Não há espaços para o julgamento. Muitas vezes nem para respostas certas.

Não é nossa “função” informar, sob nosso ponto de vista. Sem indução.
Não é nossa “missão” escolher pela mãe. Sem pressão.
Não é nosso “direito” concordar com ou discordar da sua escolha. Sem julgamento.

Ao final de tudo isso, qualquer que seja o caminho definido...
O jeito é manter mesmo o respeito. E ponto final.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545