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Amamentação: pela força do medo ou da superação?

Do site da Crescer

"Não há como chegar a qualquer resultado, em qualquer proposta, sem aliar a teoria e a prática, o conhecimento e a experiência, as abrangências e os limites", ressalta o pediatra Moises Chencinski

por Dr. Moises Chencinski - colunista

19/06/2023

Três perguntas:

- Você conhece alguém que parou de fumar porque o cigarro pode causar câncer?
- E alguém que parou de beber por saber que o álcool pode causar cirrose?
- E alguém que deixou de comer ultraprocessados por conta de riscos comprovados para a saúde (colesterol, triglicérides, hipertensão, diabetes, entre outros)?

Se conhece, deve ser uma amostra muito, muito pouco significativa. E, se isso aconteceu, há grande chance de ter sido depois do problema instalado e não somente pela informação de que poderia ser prevenido.

Essa é uma abordagem possível, que traz informação, mas busca atingir objetivos através do medo, da ameaça.

Porém, quando abordamos a amamentação, será que fazemos diferente?

Quantas mães deixaram de dar chupeta, mamadeira ou fórmula por saberem dos potenciais malefícios que isso pode causar ou por medo de prejudicarem seus filhos?

Será que uma mãe, nos dias de hoje, com todo o acesso de informações através da internet (Google, redes sociais, grupos de WhatsApp) não tem ideia ou nunca ouviu falar sobre confusão de bicos, cáries de mamadeira, questões ortodônticas com a formação prejudicada das arcadas dentárias com interferência em respiração e fala, alergia alimentar, obesidade entre outros riscos que podem acontecer na vida de seus filhos por conta desses hábitos?

Segundo os dados do ENANI-2019, o uso de mamadeira ou chuquinhas em crianças abaixo de 2 anos é comum (52,1%), assim como o de chupetas (43,9%) e a maioria das crianças (54,2%) não está em aleitamento materno exclusivo abaixo de 6 meses.

Opção, falta de opção, pressão social, cultural, econômica, marketing abusivo das indústrias, políticas públicas insuficientes ou inadequadas e até algum desconhecimento não podem ser ignorados quando essas situações ainda são comuns e frequentes.

E como transpor esses obstáculos para a mãe que está em dúvida ou deseja amamentar, seguindo as recomendações da OMS (aquelas mesmas – da sala de parto até 2 anos ou mais, exclusivo e em livre-demanda até o 6º mês)?

Seria necessário montar uma equipe multiprofissional, uma força multitarefa, com abrangência de ações em várias áreas ao mesmo tempo e que desse conta de todas as temáticas, que tivesse experiência na área, para planejamento de estratégias reais, possíveis, abrangentes... sobrecarga, que luta né?

Analisando todas essas características só uma imagem vem à mente, imediatamente: LUTE COMO UMA MÃE.

Isso poderia passar como uma força de linguagem, ou de imagem. Mas, não se pode deixar de considerar uma equipe multiprofissional, essencialmente composta de mulheres, mães, que amamentam (ou amamentaram) para propor caminhos.

Não há como chegar a qualquer resultado, em qualquer proposta, sem aliar a teoria e a prática, o conhecimento e a experiência, as abrangências e os limites. E quem teria mais “qualificações” para esse “job” do que mulheres e mães? E como é que ainda não se fez uma ampla pesquisa robusta, significativa, representativa com as mães brasileiras, das diversas regiões do país, para que se tenha um panorama a respeito das suas necessidades e prioridades?

Sobrevivência. Resiliência. Resistência. Insistência. Persistência. Representatividade. Pertencimento. Experiência. Sororidade.

Não podemos decidir por elas, não podemos decidir sem elas.

Quando falamos de aconselhamento, tão fundamental para qualquer interação de equipe de saúde materno-infantil, há algumas recomendações que, se seguidas, podem trazer mais possibilidades de manutenção do aleitamento materno, mesmo que não exclusivo, que sempre é melhor do que nenhum aleitamento (“o ótimo é inimigo do bom” – frase que ouvi de minha sogra Regina). E sem escuta ativa, sem empatia e com julgamentos pressionamos e diminuímos a possibilidade de uma aproximação e de um acolhimento favorável a todas as mães.

Habilidades de ouvir e aprender (algumas):

- Preste atenção
- Remova barreiras
- Dedique tempo
- Demonstre empatia e mostre que você entende como a mãe se sente
- Evite palavras que demonstrem julgamento

Habilidades para aumentar a confiança e dar apoio (tem mais):

- Aceite o que a mãe pensa e sente
- Reconheça e elogie o que a mãe estiver fazendo certo
- Dê ajuda prática
- Use linguagem simples
- Dê sugestões, e não ordens

Simples, não é. Trabalhoso. Mudança de abordagem, de conceitos. Eu achava que não conseguiria. Já tentou? Recomendo.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545