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Amamentação em público: uma pesquisa muito relevante. Com as mães.

Do site da Crescer

"Inacreditável como não se pensa nos resultados de se fazer leis, políticas públicas, programas sociais, sem que a mãe seja vista, ouvida, consultada. Só mesmo mães para lutarem e liderarem essa caminhada. Mas, que elas não estejam sós", destaca o pediatra Moises Chencinski

por Dr. Moises Chencinski - colunista

16/10/2023

Um estudo publicado recentemente no International Breastfeeding Journal trouxe dados importantes e relevantes a respeito da amamentação em público que podem ser aplicados para qualquer país do mundo.

Os autores fizeram uma pesquisa online que envolveu 10.451 mulheres que amamentaram nos dois anos anteriores à pesquisa na Suécia (1.252), Irlanda (1.597) e Austrália (7.602), para que respondessem uma pergunta:

O que você acha que é importante ou necessário para encorajar uma cultura de amamentação onde a amamentação em público é vista como normal?

A partir da análise das respostas foram desenvolvidos 2 grandes temas e 7 subtemas:

1- Intervenções ativas de apoio necessárias para a amamentação

Nesse grupo de temas seguem os 4 subtemas com frases dessas mães:

- Tornar a amamentação visível na sociedade
As mulheres desejariam que a amamentação fosse vista como algo que elas escolhem fazer para nutrir e estar perto dos seus filhos e que ver mães que amamentam em espaços públicos deveria tornar isso a norma, independentemente de a criança ser um bebê ou uma criança pequena.
Também foi comentado sobre a importância da representação do aleitamento de forma positiva e aberta em publicidade, nos meios de comunicação social, filmes, jornais para visibilizar e naturalizar a amamentação em público.
As pessoas devem alimentar-se como e quando for necessário. Se todos tratarmos isso como normal, será mais facilmente aceito. Quando isso é tabu, isso se torna um problema”. [Aus]

- Apoio e conhecimento dos profissionais de saúde sobre amamentação
As entrevistadas julgaram a informação fornecida sobre amamentação em público no pré-natal e no pós-parto, por profissionais de saúde, muitas vezes insuficiente e desatualizada. Assim, informação e incentivo adequados por parte dos profissionais de saúde poderia favorecer uma maior sensação de conforto para as mulheres que queiram amamentar em público, influenciando as percepções da amamentação na sociedade.
Que os cuidados de maternidade (aulas de pré-natal, maternidade, etc.) incentivem a amamentação em público”. [Sue]

- Educação do público
As mulheres relataram que a educação com informações precisas desde cedo nas escolas pode promover o conhecimento e diminuir a probabilidade de assédio, com comentários negativos, durante a amamentação em público, promovendo mudanças culturais.
Maior conhecimento sobre a importância do aleitamento materno entre a população em geral foi considerado importante para uma melhor compreensão e aceitação da amamentação em público.
Eduque crianças, adolescentes, homens e idosos que isso é natural e melhor para o bebê... e que é para isso que servem os seios”. [Irl]

- Ambiente convidativo
Ficou claro o desejo de que a amamentação fosse bem-vinda em qualquer espaço, e não ocorresse apenas em uma sala separada, “escondida”, pré-determinada, promovida como o único local onde a amamentação é aceita, contribuindo assim para o desconforto e a insegurança com a amamentação em público.
Outra proposta interessante foi sobre a importância de mais roupas adaptadas à amamentação num ambiente de apoio, facilitando a amamentação em público para as mulheres.
Espaços de amamentação que não sejam os que ficam nos sanitários dos centros comerciais”. [Aus]


2- O direito óbvio das mulheres que amamentam e crianças de ocupar um lugar em público

Nesse grupo de temas seguem os 3 subtemas com frases dessas mães:

- Tolerância zero para com as opiniões indesejadas dos outros
Foi enfatizada a importância de que não houvesse a necessidade de ter que defender a forma como mães nutrem seus bebês. Em vez disso, a amamentação deveria ser considerada a norma e ser tratada com respeito e com apoio verbal de outros cidadãos quando elas fossem expostas a comentários depreciativos ou agressivos.
Qualquer pessoa que seja rude/depreciativa com uma mãe deve ser convidada a deixar o local”. [Irl]

- Foco nas necessidades e direitos da díade que amamenta
Definir quando e onde alimentar um bebê deve ser sempre um direito das mulheres que amamentam, sem contestação. Existe o desejo de que a sociedade seja inclusiva, e apoie que as mulheres e os seus filhos lactantes possam participar da vida quotidiana, não ficando restritos a salas ou locais separados para a amamentação.
Que as necessidades de um recém-nascido em termos de nutrição e proximidade devem ser satisfeitas independentemente da localização. Caso contrário, corre-se o risco de as mães ficarem em casa, isolando-se”. [Sue]

- “Dessexualizar” a amamentação e os corpos das mulheres na sociedade
As participantes expressaram que a mama deveria ser aceita por sua função vital de amamentar, e não como um atributo sexual ou principal destaque das propagandas de lingerie. “Recuperar” o direito ao seu próprio corpo e não ser alvo de olhares constrangedores ou adversos por parte do público foi ressaltado.
Criem meninos e eduque os homens que a amamentação/seios não têm conotação sexual”. [Sue]

Não houve diferença significativa entre as abordagens nos 3 países, inclusive na hierarquia dos subtemas. Ver outra mulher amamentar em público foi o fator considerado mais relevante para uma transformação cultural com normalização na sociedade e na vida, seguido por uma educação superior do público e um ambiente convidativo e favorável.

Esse estudo traz muitos pontos relevantes, mas, talvez, o mais marcante nessa pesquisa tenha sido ouvir quem mais importa e quem é a pessoa mais interessada no processo, a verdadeira e principal protagonista da amamentação: a mulher, a mãe, a lactante.

Inacreditável como não se pensa nos resultados de se fazer leis, políticas públicas, programas sociais, sem que a mãe seja vista, ouvida, consultada. Só mesmo mães para lutarem e liderarem essa caminhada. Mas, que elas não estejam sós.

Parece justo terminar com uma frase atribuída a Santo Agostinho, possivelmente inspirado pelas mães:
A esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem; a indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las”.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545