Publicações > Meus Artigos > Todos os Artigos

VOLTAR

Para não deixarmos a amamentação de lado em nenhum mês do ano

Do site da Crescer

"Não se pode confundir más práticas e orientações inadequadas de todos os envolvidos nos cuidados com a amamentação com a validade e a cientificidade do leite e do aleitamento materno", diz o pediatra Moises Chencinski

por Dr. Moises Chencinski - colunista

06/11/2023

Saímos do AGOSTO DOURADO, mês de sensibilização e conscientização sobre a importância do aleitamento materno e o que era esperado já está acontecendo.

A transição para o SETEMBRO AMARELO (“Se precisar, peça ajuda” – prevenção do suicídio), pelo OUTUBRO ROSA (“Informar para proteger. Cuidar para viver” – informação e prevenção do câncer de mama), chegando ao NOVEMBRO ROXO (“Pequenas ações, GRANDE IMPACTO: contato pele a pele imediato para todos os bebês, em todos os lugares” – sensibilizando em relação à prematuridade infantil) trouxe um certo “esquecimento” sobre a importância do aleitamento materno.

E justo o leite materno, que pode prevenir o câncer de mama, diminuir a incidência da depressão, é tão fundamental para a sobrevivência do prematuro e que precisa ter sua relevância reforçada durante o ano todo. 

Aí, embasadas em informações, algumas incorretas, em crenças e experiências pessoais, em situações já conhecidas, mas não tão bem explicadas, surgem diversas “notícias” nas redes e nas mídias sociais.

Aqui estão trechos de três matérias publicadas quase agorinha que merecem sua atenção e que serão comentados ao final.


Amamentação e depressão pós-parto (DPP)

Publicado (31/10) no Current Psychiatry Reports, esse artigo tem o objetivo de fornecer informações atualizadas sobre a relação entre DPP e amamentação. Já é reconhecido que mulheres que amamentam exclusivamente têm menor risco de desenvolver DPP significativa, que é mediada por fatores psicológicos e fisiológicos, entre eles os hormonais envolvendo cortisol, ocitocina, progesterona e estrogênio.

Embora as evidências sugiram uma relação positiva entre a amamentação e a saúde mental, deve-se notar que a experiência da amamentação – dor, dificuldade de pega, emoções maternas e envolvimento do bebé durante a amamentação – pode servir como um fator de stress ou como amortecedor do humor materno... que a amamentação é um estressor associado ao aumento da ansiedade ou depressão, em vez de um fator protetor”.

Além disso, outros sentimentos envolvidos nos desafios da amamentação como culpa (por interrupção precoce ou indesejada, por exemplo), sentimentos negativos em relação ao corpo, autocompaixão e sono interrompido podem estar associados a sintomas depressivos mais elevados que podem ser favorecidos por emoções positivas, contato visual sustentado, conversa com o bebê durante as mamadas.


Mitos sobre a amamentação: o peito é o melhor?

Esse artigo publicado (01/11) no Psychology Today, parte de 3 “pontos chave” – 2 bem reais e um, no mínimo, cientificamente incorreto:

- Há muita pressão sobre as mulheres para amamentar.
- A fórmula possui toda a nutrição do leite materno.
- O bem-estar da mãe e do bebê devem ser considerados. 

O texto abre com a história de Mary, que luta contra o mau humor, com falta de apetite, perda de peso, insônia, e problemas para se relacionar com o filho. Mesmo se programado para amamentar seu bebê, produzia pouco leite. Uma consultora de lactação orientou amamentar, extrair o leite e depois amamentar novamente, 12 vezes por dia.

Utilizando referências do site FED is BEST, “que apoia a amamentação e a alimentação com mamadeira”, a autora (psiquiatra) questiona a validade de estudos que apontam para os benefícios do leite materno relacionados a diminuir os riscos de infecções dos tratos respiratório e digestivo, otite média, entre outras, denunciando “algumas falhas importantes” na abordagem, apontando possíveis fatores de confusão com questões socioeconômicas e psicossociais.

Segundo a autora, “a maior parte da literatura sobre amamentação limita-se a estudar mulheres que geralmente eram bem-educadas e financeiramente seguras” o que justificaria “as supostas vantagens da amamentação”, reforçando que “é apropriado encorajar, mas não pressionar, as mulheres a amamentar. No entanto, o estado mental da mulher também deve fazer parte da consideração”.


A amamentação pode ser melhor para o bebê, mas são as mães que fazem os sacrifícios

Nessa matéria (02/11), uma escritora que amamentou seu filho por três anos relata sua experiência e “resume os sacrifícios das mães que amamentam”em uma série CNA Mulheres sobre o tema, referindo que “na década de 1960, a amamentação não estava na moda. Se você queria o melhor para seu filho, o leite em pó era o que você dava a ele. Foi até considerado melhor que o leite materno”.

Segundo a escritora, “o leite materno pode ser gratuito, mas as bombas de extração de leite e os sacos de armazenamento são caros. Sem mencionar os muitos sacrifícios que as mães que amamentam aceitam de bom grado para manter seus bebês bem alimentados”.

Entre os sacrifícios durante esses três anos, ela ressalta algumas questões conhecidas e já desmistificadas como pouco leite, leite fraco, restrições (café, chá, álcool, coentro, hortelã, alecrim, tomilho e erva-cidreira) e indicações (sopa de mamão e peixe, carne, tofu, vegetais de folhas verdes, nozes) na alimentação materna, ingurgitamento mamário e mastite que todas as mulheres que amamentam passam, restrição no uso de antibióticos e outros medicamentos.

A volta ao trabalho com preparo para extração de leite (bomba, mamadeiras esterilizadas, bolsas de gelo, bolsa térmica), expectativa de uma sala de apoio à amamentação, horários mais restritos e organizados para acolher reuniões, viagens e a extração e armazenamento do leite, com risco de não evolução na carreira ou até demissão fazem parte do dia a dia das lactantes.

E o final a matéria é um alerta: NÃO VAMOS ROMANTIZAR A AMAMENTAÇÃO.

A amamentação é uma jornada pessoal e íntima que a mãe escolhe embarcar com seu filho. Ela não está procurando tapinhas nas costas. Ela está muito ocupada apenas tentando fazer as coisas funcionarem. E se ela decidir não fazer isso? Isso é problema dela, então fique longe disso, obrigado”.

Apesar de as 3 matérias trazerem alguns conceitos bem questionáveis e sem nenhum embasamento científico, outros bem básicos e óbvios (talvez não para todos) sobre a escuta ativa e a sobre a decisão ser das mães (por exemplo), experiências pessoais verdadeiras sempre devem ser valorizadas, mas não, necessariamente, tomadas como regras.

DESROMANTIZAR SEM DEMONIZAR A AMAMENTAÇÃO. Até já escrevi sobre isso aqui.

Não se pode confundir más práticas e orientações inadequadas de todos os envolvidos nos cuidados com a amamentação com a validade e a cientificidade do leite e do aleitamento materno. E que se saia sempre com a certeza: AMAMENTAR NÃO DEVE DOER. Se tem dor envolvida, a busca de orientação profissional capacitada e habilitada é fundamental.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545