16/05/2024
Esse foi mais uma lista de perguntas que me fizeram retomar temas bem polêmicos.
Aliás, nem entendo bem qual a razão para tanta polêmica para um único assunto, uma prática tão ancestral.
Foi essa. Mas não para por aqui. Tem pelo menos mais duas. Rsrs
O que fazer quando o bebê dorme no peito?
Um bebê está com fome, reclama, a mãe o amamenta. Ele relaxa e pode dormir. Isso sem contar que pode continuar a mamar enquanto adormece. E isso pode acontecer em várias situações, dentro ou fora de casa (nunca em um veículo em movimento), em qualquer horário, em qualquer posição recomendada para amamentação.
Em 2.015, dois autores (James McKenna e Lee Gettler) publicaram uma matéria na revista Acta Paediatrica sob o título original “There is no such thing as infant sleep, there is no such thing as breastfeeding, there is only breastsleeping” que, por aqui, podemos traduzir por “Não existe sono infantil, não existe amamentação, só existe dormir no peito”.
Esses autores também advogam a favor da cama compartilhada segura. E, aí, a adoção do “breastsleeping” que, aqui no Brasil, teve a divulgação pela pediatra Dra. Mariele Rios, do perfil @umamaepediatra, com o termo “Sonamentação” (que passo a adotar agora, nesse texto, substituindo “breastsleeping”).
Segundo McKenna e Gettler, as propostas da sonamentação indicam fortemente o papel que o contato materno sustentado desempenha na ajuda ao estabelecimento da amamentação e que o sono infantil normal, saudável e humano não é mensurável com precisão fora do contexto da “sonamentação”, que é “o sono mais antigo e mais bem-sucedido da humanidade”.
Em 2019, a Academia de Medicina da Amamentação (ABM) lançou seu Protocolo 6 sobre amamentação e compartilhamento de cama (McKenna, Peter Blair, Helen Ball, Melissa Bartick e outros). Os autores analisaram a literatura científica atual e concluíram que “as evidências existentes não apoiam a conclusão de que a partilha da cama entre crianças amamentadas (isto é, que dormem no peito) causa a síndrome da morte súbita infantil (SMSL) na ausência de riscos conhecidos”.
Assim, “a sonamentação” pode acontecer em qualquer idade e para que aconteça em cama compartilhada deve seguir sérios critérios de segurança. A recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria é dormir em camas separadas e no mesmo quarto dos pais até um ano de idade, para a prevenção da Síndrome de Morte Súbita Infantil.
Mas, a realidade da família que prevalece em grande parte das pesquisas é a de cama compartilhada e, para isso, as orientações sobre as recomendações de segurança são fundamentais, como descrito no Capítulo 29 do livro do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade de Pediatria de São Paulo – Aleitamento Materno na Era Moderna – Vencendo Desafios.
1.Nunca dormir com o bebê no sofá ou poltrona.
2.Não colocar o bebê para dormir com pessoas que tenham ingerido álcool ou usado drogas.
3.O bebê deve dormir de barriga para cima.
4.Não dormir com pessoa que fuma ou que convive com quem fuma.
5.A cama deve estar afastada da parede ou de outros móveis para evitar que a cabeça ou o corpo fiquem presos em um vão.
6.A superfície da cama deve ser firme, sem cobertores grossos, sem travesseiros ou outros objetos que possam causar sufocamento.
7.Não deixar o bebê sozinho na cama.
8.A mãe deve dormir em posição encurvada, como um C, em volta do bebê, e ele deve ser colocado de barriga para cima após a mamada, com a cabeça na direção do peito da mãe, sem travesseiro e sem nada que possa encobrir sua cabeça.
9.O lactente não deve compartilhar a cama com pessoa que esteja muito cansada e que possa ter dificuldade para despertar.
10.Não é recomendado colocar um bebê para dormir com dois adultos na mesma cama, pois não há evidências suficientes para apoiar esse procedimento.
11.Não julgar os pais que optam por compartilhar a cama. A melhor solução é orientar como evitar as situações de risco e, se essa for a intenção, como fazê-lo com mais segurança.
E podemos até acrescentar outras recomendações também muito importantes.
- Não superaquecer o bebê.
- Não cobrir a cabeça.
- Amamentar – o aleitamento materno protege contra a morte súbita.
- Não colocar brinquedos ou outros objetos no berço.
- Seguir o calendário de imunização.
- Não usar posicionadores ou apoios para manter o bebê em uma posição desejada.
- Não está indicado o uso de monitores cardiorrespiratórios em casa.
- Lembrar-se de orientar a mudança de decúbito, quando o bebê estiver acordado, algumas vezes ao dia, para evitar a plagiocefalia postural, mas sempre sob supervisão.
É muito importante que um bebê tenha seu acompanhamento periódico com um pediatra (puericultura). Essa orientação pode começar a partir da 32ª semana de gestação, em uma consulta recomendada pela Sociedade Brasileira de Pediatria. Depois do parto, a partir de 5 a 10 dias de vida, avaliações regulares (mensais ou bimestrais) no primeiro ano de vida, trimestral no segundo ano, semestral até 4 anos e depois uma vez por ano até a adolescência.
Nessas avaliações são analisados crescimento e desenvolvimento, alterações clínicas, emocionais, sociais e orientadas alimentação, vacinação, atividades, contato com a natureza, entre outras.
A amamentação merece uma atenção especial porque, como já foi tema da 27ª Semana Mundial de Aleitamento Materno (2.018), é a base da vida. E são vários os aspectos a se considerar quando se aborda o tema. Nesse caso, em especial, há muitos dados a se considerar – livre-demanda, crescimento (peso, comprimento e perímetro cefálico), atividade, desenvolvimento entre outros.
Assim, se o bebê dormir com frequência no seio e durante as consultas o pediatra analisar que isso pode interferir em alguma questão, ele pode orientar ações para ajustar essa dinâmica, em benefício da dupla mãe-bebê.
São muitas as orientações a respeito de amamentação que podem favorecer o ajuste do processo. Um dos mais importantes, e que se modificou com o tempo, é a livre-demanda. A “recomendação” que era de mamar 10 a 30 minutos de cada lado, em intervalos regulares de 3 horas não respeita a individualidade e as necessidades nutricionais do lactente. Assim, é o bebê quem determina o intervalo entre as mamadas, a sua duração, se vai mamar em um ou nos dois seios. Quando isso é “imposto” a ele, pode não ser o momento da fome ou da sede e a mamada não fica adequada.
O contato pele a pele é outra dica importante que pode trazer muita vantagem nessa dinâmica também. A mãe pode estar em um espaço seguro, confortável e colocar seu bebê só com a fraldinha em contato direto com seu corpo. Essa é uma prática que protege a temperatura do bebê, transfere a microbiota da pele da mãe para ajudar na formação da flora intestinal do lactente, fortalece o vínculo e pode manter o bebê mais alerta para a mamada.
Quando o bebê para de mamar em um seio e está muito sonolento, a troca de fraldas nesse momento, se for necessário, pode ajudar a manter esse bebê mais alerta e, aí, mamar na outra mama.
A pega correta é fundamental para que a mamada se estabeleça de forma confortável e mais definitiva. Muitas vezes, se existe alguma disfunção nessa pega, o bebê suga, mas não consegue extrair o leite adequadamente, e, pelo “esforço” muitas vezes excessivo se cansa e adormece durante a mamada, ainda que não esteja saciado. Isso pode fazer com que ele acode em intervalos menores, exigindo mais da mãe.
Mais uma vez, é necessário que a rede de apoio inclua uma equipe de saúde materno-infantil habilitada e capacitada a observar a mamada, reconhecer os desafios e ajudar a mãe a superá-los.
Uma mamada tem um começo e um fim. Na maior parte das vezes, a mãe sabe reconhecer o ritmo de mamada de seus bebês e essa troca de informações com seu pediatra, durante as consultas de rotina, ou com outros membros da equipe de saúde materno-infantil durante algum acompanhamento pode direcionar as recomendações.
São muitos fatores analisados para o acompanhamento adequado sobre aleitamento materno. É necessário:
- Ter informações atualizadas, éticas, sem conflitos de interesse;
- Ter escuta ativa, empatia, sem julgamentos;
- Observar a mamada, do começo ao final, nos dois seios (quando acontecer);
- Ter habilidades de comunicação para que a mãe se sinta acolhida e não “culpada”.
Isso e muito mais. É simples? É fácil? Não. Nada disso.
Então essa decisão (acordar ou deixar dormir um bebê que adormece mamando) deve ser analisada em cada caso, com muito cuidado, carinho e atenção.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545