Do site da Crescer
"A amamentação é um mundo inteiro de experiências, de conhecimentos, de desafios", diz Moises Chencinski em reflexão sobre a influência da amamentação no desenvolvimento e crescimento craniofacial dos bebês
por Dr. Moises Chencinski - colunista
12/06/2024
Quando se aborda o aleitamento materno, é fundamental lembrar que ele é multifatorial e, por isso, pode requerer a atuação de uma equipe multiprofissional. Vale, também, ressaltar que o protagonismo da amamentação não é de pediatra, ou de consultoria, ou de fono, ou de odontopediatra ou de qualquer outro profissional da área de saúde materno-infantil.
O protagonismo foi, é e deverá ser sempre da mãe e do bebê.
Esclarecendo (dicionário – lógico)
Protagonista: Participante ativo ou de destaque em um acontecimento.
Os profissionais são parte importante da rede de apoio dos protagonistas (dupla ou díade mãe-bebê). A escuta, o acolhimento, o apoio, a informação, a intervenção (quando necessária) são partes das participações desses coadjuvantes no processo da amamentação.
Coadjuvante: que ou o que coadjuva, auxilia ou concorre para um objetivo comum; cooperador (dicionário? Sim).
Recebi, quase em primeira mão (publicado em 6 de junho), um artigo indicado por uma dessas coadjuvantes (como eu sou - Dra. Sylvia Lavinia Martini Ferreira – odontopediatra) a respeito de um tema importantíssimo nas questões do aleitamento materno: Ortopedia funcional dos maxilares e crescimento craniofacial (nome do site do jornal que traz artigos científicos originais sobre o tema).
Nesse estudo, foi analisada a prevalência de problemas de oclusão dentária infantil, comparando a duração de amamentação, o uso de chupetas e mamadeiras em crianças de 2 a 6 anos de escolas públicas de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul.
Esse é um problema comum no mundo (na primeira infância é de 54%). Esse estudo avaliou 1.938 crianças entre 2 e 6 anos e a prevalência de má oclusão encontrada foi de 23% (mordida aberta anterior, com ou sem mordida cruzada posterior, foi a que mais apareceu).
Esses dados foram avaliados de acordo com prática ou não de aleitamento materno, sua duração e uso de chupetas e mamadeiras. Perto de 70% das crianças não foram amamentadas ou foram amamentadas por menos de 6 meses, e tinham hábito de sucção não nutritiva (mamadeiras e chupetas).
Os resultados mostraram que, entre essas crianças que foram incluídas no estudo:
- 23% (444 crianças) apresentavam algum tipo de má oclusão.
- Nesse grupo, 36,5% não foram amamentadas ou foram amamentadas por menos de 6 meses (34%).
- 66% usam chupeta e 2% chupam o dedo.
- Só nas crianças com 5 anos de idade (808 crianças), a prevalência da má oclusão aumentou para 54%.
Os autores concluíram que ficou clara a influência do curto período de amamentação e da presença de hábitos de sucção não nutritivos (chupeta e mamadeira) na prevalência de más oclusões. A proposta foi que, “dada a elevada prevalência de má oclusão encontrada neste projeto piloto (especialmente em crianças aos 5 anos de idade), a associação com curto período de amamentação e a presença de hábitos de sucção não nutritivos, urge a necessidade de políticas públicas de saúde que promovam e apoiem a amamentação prolongada e a ampliação do conhecimento dos pais e funcionários da escola sobre os efeitos adversos causadas pelo uso de chupetas e mamadeiras, com adoção de medidas transdisciplinares para a prevenção, interceptação e tratamento da má oclusão em tempo hábil”.
Retomando meu papel de “pediatra investigativo”, enquanto pesquisava as fontes e dados, encontrei outra publicação recente (2.023) que abordava a associação da duração do aleitamento materno com o desenvolvimento de respiração oral e alterações de oclusão em 155 pré-escolares, de 2 a 5 anos, em 3 escolas públicas em Lima, no Peru, divididos em dois grupos:
- Grupo A (50 crianças) - bebês amamentados até 6 meses
- Grupo B (105) - bebês amamentados por 6 a 12 meses.
Os resultados apontaram que:
- Crianças do grupo B (amamentadas por mais de 6 meses) tinham menos riscos de apresentar respiração oral.
- Uso de mamadeira por mais de 24 meses (2 anos) aumentou muito a chance de aparecimento de mordida aberta anterior (problema de oclusão).
Vejam que explicação interessante do estudo:
“Durante a mamada, os bebês têm que respirar pelo nariz. A boquinha deles está ocupada demais, fechada na mama, sem deixar entrar ar. A amamentação promove a respiração nasal devido à sucção, e isso resulta no desenvolvimento craniofacial adequado e previne infecções respiratórias. Já na mamadeira, a língua fica mais abaixo e mais para trás e os lábios são separados, o que torna a atividade da língua mais fraca”.
E a proposta dos autores poderia fechar essa coluna hoje:
“Nossos resultados são relevantes para promoção da saúde pública, odontopediatria e ortodontia. Os médicos devem estar cientes dos benefícios da amamentação exclusiva prolongada. Portanto, poderão educar os leigos sobre a prática correta do aleitamento materno exclusivo para obter todos os seus benefícios. Por fim, os resultados deste estudo permitem concluir que crianças pré-escolares que têm amamentação prolongada têm menor probabilidade de apresentar respiração oral. Além disso, o uso prolongado da mamadeira pode produzir alterações oclusais e levar à presença de mordida aberta anterior em crianças.”
A amamentação é um mundo inteiro de experiências, de conhecimentos, de desafios. Cabe a cada um de nós apoiar e fazer dela a melhor das experiências, compondo, através de nossos conhecimentos, condições para cada mãe que quiser amamentar superar esses desafios.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545