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A estética na amamentação: guia de procedimentos estéticos no aleitamento e outros cuidados

Do site da Crescer

Conteúdo produzido e revisado por:

Dr. Moises Chencinski - Médico pediatra. Membro da Rede IBFAN. Membro do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade de Pediatria de São Paulo. Colunista da Crescer

Dr. Roberto Chaves - Médico Pediatra. Doutor em Pediatria (UFMG). Professor do curso de Medicina da Universidade de Itaúna, MG

Moises Chencinski e Roberto Chaves

19/07/2024

Você está amamentando? Seguem as “recomendações”.

Não pode:

-Tomar refrigerante, porque o gás passa pelo leite e provoca gases no bebê;

-Comer feijão, porque ele provoca cólicas e gases no bebê;

-Pintar os cabelos, porque pode intoxicar o bebê;

-Tomar leite de vaca, porque pode provocar alergia no bebê ou até intolerância à lactose;

-Comer comida japonesa, porque o cru pode trazer infecções para o bebê;

-Comer temperos fortes (alho, cebola, pimenta) porque podem mudar o sabor do leite e o bebê pode rejeitar;

-Tomar café, chá, bebidas alcoólicas porque podem trazer insônia ou muito sono e o bebê terá dificuldade para acertar seu sono e mamar bem;

-Comer amendoim, camarão porque podem produzir algumas substâncias que, liberadas no leite materno podem irritar o intestino do bebê, provocando cólicas;

-Tomar nenhum remédio porque tudo pode passar pelo leite e trazer graves consequências na saúde ou até na vida do bebê.

Essa lista poderia aumentar indefinidamente e teríamos uma matéria cheia de “castigos” e “proibições” para a mãe que quer amamentar, e colocaria em dúvida, até sua intenção de aleitamento materno desde a sala de parto até dois anos ou mais, exclusivo e em livre demanda até o sexto mês.

Mais uma vez, como sempre, muita calma nessa hora. Buscar informações cientificas, atualizadas, de profissionais sem conflitos de interesse, de confiança é um dos primeiros passos a se levar em conta.

Mas, minha amiga, minha prima, minha irmã, minha mãe, aquela influenciadora tiveram esse problema e elas disseram que ... Mais uma vez, muita calma nessa hora. Toda situação vivida por cada uma dessas mulheres deve ser respeitada e acolhida. Massssssssssssss......... EXPERIÊNCIA PESSOAL NÃO É EVIDÊNCIA CIENTÍFICA.

Então, segue a primeira pergunta, que não quer calar, fundamental, para continuarmos a nossa conversa.

Tudo passa pelo leite materno?

A resposta é: Não, nem tudo passa para o leite materno. A “travessia” de substâncias, como alimentos, cosméticos e medicamentos, que vamos chamar aqui de “produtos”, depende de vários fatores. Vamos lá!

- Muitos produtos ingeridos pela mulher não chegam ao leite materno se não forem absorvidos pelos intestinos da mãe ou sejam absorvidos pela pele ou pelos pulmões e cheguem ao seu sangue.

- É geralmente aceito que quase todos os medicamentos são transferidos para o leite humano até certo ponto, embora seja quase sempre em concentrações bastante reduzidas. Apenas raramente a quantidade transferida para o leite produz doses clinicamente relevantes no lactente.

Imagine o caminho: a mãe come uma banana, que passa pelo processo de digestão - boca, esôfago, estômago, intestinos. Junto com outros "produtos", o resultado dessa digestão vai para o sangue que circula no corpo da mãe. Uma parte desse "produto" vai para as mamas da mãe, tem que ultrapassar uma barreira e uma parte do que chega vai para o leite que é, então, passado para o bebê. A parte, da parte, da parte... (entendeu né?) que o lactente mama passa pelo processo digestivo no bebê - boca, esôfago, estômago, intestinos. E, aí, o resultado dessa digestão vai para o sangue que circula no corpo do bebê para, só então, agir no seu organismo.

As variáveis que determinam a transferência de substâncias para o leite materno são o peso molecular, a concentração plasmática, o grau de ionização, a capacidade de ligação a proteínas plasmáticas e lipossolubilidade da substância. Complicado, né? Vamos falar um pouco apenas dos dois primeiros:

- Peso molecular: substâncias com elevado peso molecular (“maiores e mais pesadas”), como a heparina, não conseguem atingir o compartimento lácteo. Elas não passam pelo “filtro” da mama.

- Concentração plasmática: é quanto da substância tem no sangue. Assim, quanto maior a dose e a concentração no sangue da mãe, maior a chance de concentração elevada no leite materno.

Informação importante: Medicamentos aprovados para uso por lactentes (os bebês) devem ser considerados seguros para uso por nutrizes (as mães), mesmo que sua excreção para o leite materno seja significativa. Já substâncias sabidamente tóxicas, como a cocaína tem seu uso contraindicado durante a amamentação.

Dez itens do dia a dia: Pode ou não pode? “Quase” simples assim?

Para essa resposta, consultamos manuais, livros, estudos, referências e o que trazemos aqui é a recomendação e a orientação mais geral. Alguns sites podem até ser consultados por todos na internet e, mesmo que os profissionais não gostem muito disso, não há como filtrar essas fontes para mães que querem (e precisam) ter essas orientações mais acessíveis. Mesmo assim, é importante que todas essas informações sejam checadas com o pediatra que faz o acompanhamento da dupla mãe-bebê.

Uma sugestão para a consulta da segurança de medicamentos e outras substâncias pela nutriz é o site em espanhol e-lactancia.org.

1) Tatuagem

Tem quem faça. Tem que goste. Tem quem ache horroroso. Tem quem se assuste. Tem quem tenha preconceito. Mas não há como negar que é um hábito cultural, social, de identidade, “tribal” cada vez mais comum no Brasil.

Você sabia que o Brasil é o 9º país do mundo em tatuagens (segundo pesquisa da IBIS World – 32% da população), o 1º lugar em buscas na internet sobre o assunto, desde 2.004 (segundo a série da plataforma Google Trends) e a palavra (tatuagem) é a 2ª mais buscada na categoria condicionamento físico e beleza (dados de julho de 2.023), atrás apenas de “cabelos”?

“Quem amamenta pode fazer tatuagem” é a 9ª pergunta entre as mais buscadas no Brasil sobre o tema (a 1ª é sobre doação de sangue).

Assim, segundo estudos e publicações sobre o tema, é possível fazer tatuagem durante a amamentação, desde que não seja em mamas e região de mamilos, pelos riscos de inflamações no local e obstrução de dutos mamários.

Já quem fez tatuagem anteriormente, mesmo nas mamas ou mamilos, que não geraram processos inflamatórios ou obstrutivos na época, provavelmente não trarão consequências para a amamentação atual.

É primordial que haja um controle higiênico-sanitário do estabelecimento, para evitar riscos de infecções (Hepatites B, C, HIV sífilis e outras), dentro das limitações legais (estúdio regulamentado).

Não há uma lei nacional que estabeleça idade mínima para se fazer tatuagem. O PL 4298/2012, por exemplo, que ainda não foi aprovado (2.024), estabelecia que abaixo de 16 anos, mesmo com autorização dos pais, o procedimento seria proibido, sendo autorizado entre 16 e 18 anos, “somente na presença dos pais ou responsável e mediante autorização por escrito, com assinatura reconhecida em cartório”.

Essa legislação, no Brasil, é estadual ou municipal, com variações locais que precisam ser conhecidas para a legalidade de qualquer procedimento. Mas é consenso que só é permitido tatuar o corpo, sem autorização dos pais, a partir dos 18 anos.

ATENÇÃO E CUIDADO - REMOÇÃO DE TATUAGEM:

A remoção feita com laser quebra os pigmentos da tatuagem, que passam para a linfa e o sangue e podem chegar ao leite, por isso seria prudente esperar até o término da amamentação, dependendo do tipo de pigmento a ser removido.

2) Piercing

Apesar de no Brasil, o piercing ter sido utilizado inicialmente nos anos de 1.970, atribuído à onda hippie, há descrição de novas evidências arqueológicas (Turquia) que o colocam como prática corporal há mais de 12.000 anos.

Assim como no caso das tatuagens, essa é uma prática crescente no Brasil, que também requer atenção nas questões de higiene e prevenção de infecções, durante e após sua aplicação. Hepatite B, C, HIV, lesões dermatológicas (infecções bacterianas, alergias, queloides) são algumas das possíveis complicações (estimativa de 20%) que podem comprometer a saúde e a vida de quem decide utilizar piercings.

Até por conta desses dados, é importante que a pessoa que decide pela sua colocação esteja com sua carteira de vacinação em dia (prática recomendada a toda população, independente de faixa etária) e que essa aplicação não seja realizada em qualquer situação de alteração de imunidade (qualquer doença que possa interferir na resposta imune).

É um procedimento que deve ser realizado em estabelecimentos com alvará da Vigilância Sanitária dentro da validade e por profissionais (body piercers) qualificados e bem orientados.

O piercing, que pode ser colocado em diversas partes do corpo, também gera reações contraditórias, variando de apreciação até desconforto. A recomendação, independentemente da idade da mulher, é a não aplicação em região de mamas e mamilos, tanto pelas questões técnicas (a perfuração é na base do mamilo, não na aréola, não nos seios e nem na ponta para evitar que enrosque em roupas), quanto pela possível interferência na amamentação. A cicatrização completa pode ser bem demorada, com referências de até um ano.

Em mulheres que vão amamentar e já têm o piercing, a recomendação é a sua retirada já no início da gestação, para não colocar em risco a pega ou engasgos. O furo do piercing pode até influenciar na ejeção do leite influenciando a pega mais adequada do bebê.

Complicações como lesões na pele, danos aos ductos mamários, mastites ou até abscessos mamários, com presença de fístulas podem prejudicar a amamentação.

A aplicação de piercing em outras partes do corpo, em ambiente seguro e por profissional habilitado e capacitado, não traz riscos ou não interfere na amamentação.

3) Botox

Há escassez de estudos científicos que avaliem a segurança desse medicamento durante a amamentação. Há relato de um bebê amamentado com segurança no curso da doença botulismo em uma mãe e nenhuma toxina botulínica foi detectada no leite materno ou no bebê. Como as doses desse produto são muito menores do que aquelas que causam botulismo, espera-se que as quantidades ingeridas pelo lactente, se houver, sejam insignificantes e não causem quaisquer efeitos adversos em lactentes amamentados.

A toxina botulínica tem um peso molecular (lembra dele) alto o que ajuda a explicar sua compatibilidade com a amamentação.

4) Peeling químico

Substâncias utilizadas para a realização do procedimento estético peeling contém ácidos que aplicados sobre a pele promovem sua descamação com o objetivo de renovação das células. Esses ácidos - salicílico, retinóico, glicólico – não são absorvidos pela pele e, consequentemente, não estarão presentes no leite materno. Dessa forma, são considerados de uso seguro para uso pela nutriz.

5) Ácido hialurônico

Substância que pode ser utilizada injetável (para preenchimentos) ou por aplicação local (cremes), muito em uso não só na área de estética como o peeling químico, mas em outros procedimentos de preenchimentos e infiltrações por sua ação de “puxar” água (hidratação) com redução de rugas e linhas e nas articulações para diminuir dores e favorecer mobilidade articular.

Quando usado como parte de suplementos para tomar não traz riscos à amamentação por não ter nenhuma biodisponibilidade oral.

Por ser uma substância de altíssimo peso molecular (olha ele aí mais uma vez), a sua absorção e passagem para o leite materno é extremamente pequena. Mesmo as novas versões da substância, com menor peso molecular para atingir áreas mais profundas da derme, não interferem ou influenciam a amamentação.

Para concluir, é uma substância que existe naturalmente no nosso organismo e também no leite materno e não traz riscos para o lactente, sendo compatível e seguro na amamentação.

6) Laser

Mais uma das modernizações que poderiam ser usadas para o bem ou nem tanto. Por ser um procedimento recente, sua utilização indiscriminada ainda requer mais informações, controle e superevisão.

Sociedades de Dermatologia em várias partes do mundo consideram a depilação com raios laser um procedimento seguro durante a lactação. A aplicação de laser para tratamento de fissuras mamilares é prática comum sem efeitos adversos na criança ou na lactação.

Vários procedimentos para tratamento de varizes como o laser, crioesclerose e ablação são considerados seguros para a realização durante a amamentação. Outros produtos utilizados para o mesmo fim, como solução salina aquosa, microespuma, hidroxi-polietoxi-dodecano, tetradecil sulfato de sódio, polidocanol, lauromacrogol, glicerina cromatada, salicilato de sódio, são irritantes que, quando aplicados corretamentecorretamente (mesmo com esse tanto de nomes complicados e difíceis), não entram na corrente sanguínea em quantidades significativas e, portanto, também não chegam ao leite materno. 

7) Tintura de cabelo

A prática de tingir os cabelos é considerada segura caso o produto não contenha chumbo. Atualmente, a presença desse metal pesado em tinturas é aprovada pela Anvisa na concentração máxima de 0,6%. Contudo, seu uso é contraindicado durante a amamentação em virtude da ausência de estudos sobre sua segurança para uso nesse período. A informação, frequentemente divulgada em fontes não científicas, de que tinturas contendo amônia devem ser evitadas durante a lactação não encontra respaldo na literatura, ou seja, fake news.

As tinturas capilares são produtos amplamente utilizados por muitas culturas e civilizações. Os componentes naturais, de menor risco são: Henna, Açafrão, Camomila e Noz entre outros. Os componentes sintéticos são: anilina e outros derivados do benzeno, metais pesados como o chumbo (esse não, tá?).

Durante a amamentação, recomenda-se um uso limitado, seguindo os conselhos que acompanham o produto, um banho após a tintura para manter limpa as mamas e usar cabelo curto para minimizar a absorção de produtos potencialmente tóxicos.

As mães que trabalham em salões de cabeleireiro devem observar todas as medidas preventivas, como o uso de luvas para manipular o produto, visando minimizar a absorção pela pele.

8) Escova progressiva

Essas podem ser realizadas pelas nutrizes desde que não contenham formol, que, quando utilizado em altas concentrações, é uma substância tóxica. O formol é um produto altamente volátil (pode virar vapor ou gás), que irrita os tecidos respiratório, ocular e cutâneo. É um produto acrescentado em fórmulas caseiras com função alisante na concentração aproximada de 3,5%. As lactantes cabeleireiras apresentam maior risco de exposição e, assim, de intoxicação.

Embora tenham sido observadas alterações hormonais ligeiras em mulheres expostas a misturas de solventes orgânicos com formol, poucos dados estão disponíveis na literatura científica sobre a passagem desse produto para o leite materno de mães trabalhadoras.
Apesar da crescente preocupação com a exposição laboral ao formaldeído em mães lactantes, as fichas técnicas consultadas sobre essa substância não oferecem qualquer declaração sobre riscos ou conselhos de advertência em relação à amamentação.

O formol é rapidamente destruído no sangue e nos tecidos. Por isso, se acredita que o formaldeído, inalado ou em contato com a pele, muito provavelmente não passaria da mãe para o bebê através do leite materno. Mas, em locais de trabalho com elevados níveis de exposição (salões de beleza que manipulam o produto, departamentos de patologia e instalações forenses), isso até pode acontecer. Assim, várias agências recomendam, como medida prudente, que as mulheres que amamentam sejam afastadas de funções que envolvam altos níveis de exposição ao formol. Cabe lembrar que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) só permite o uso do formol em cosmética como conservante (concentração de 0,2%) ou como agente para endurecimento de unhas (concentração de 5%), ou seja, seu uso como alisante não é autorizado.

9) Protetor solar

As medidas mais seguras e eficazes para proteção contra os raios solares são: evitar exposição prolongada ao sol, horas de exposição mais elevadas, promover o uso de roupas, chapéus, óculos de sol e abrigos à sombra.

Dentre os produtos comerciais para esse fim é importante lembrar que os protetores solares físicos, como o óxido de zinco ou de titânio e o carbonato de cálcio ou de magnésico, são os mais seguros para uso pela lactante. Os protetores solares químicos atingem a corrente sanguínea e compartimento lácteo com risco teórico de efeito disruptor endócrino.

Não é recomendado aplicar qualquer tipo de protetor solar no seio (aréola ou mamilo) se estiver amamentando.

10) Repelente

Os dois repelentes mais eficazes e mais utilizados são o DEET e a icaridina.

O DEET (Dietiltoluamida) é um repelente de insetos eficaz contra mosquitos, moscas, carrapatos e pulgas. Não há estudos que avaliaram sua excreção pelo leite materno. Suas características farmacológicas (baixo peso molecular, absorção cutânea moderada e alta afinidade ao tecido adiposo) tornam possível sua transferência para o leite em quantidades que podem ser significativas, porém ainda não há evidências de que o uso de DEET em mães que amamentam afete a criança. Evite o uso de produtos com concentração superior a 25%. Aplique somente nas áreas expostas da pele e não utilize nas mamas.

A icaridina, é uma alternativa mais nova e potencialmente mais segura que o DEET. Não causa irritação na pele e é inodoro. Não precisa ser lavada ao retornar para dentro de casa. É seguro para uso em crianças a partir de 3 meses de vida. Estudos mostraram que menos de 6% das doses aplicadas foram absorvidas após aplicação tópica. Devido à sua solubilidade lipídica, é provável que entre no leite, mas concentrações desprezíveis.

Para terminar – Dicas importantes

- Informe ao seu médico caso haja suspeita de possível efeito adverso do medicamento em uso sobre a saúde do bebê

- Caso o medicamento a ser utilizado apresente risco à saúde do bebê, e não possa ser substituído por um produto mais seguro, recomendamos a realização da extração e estocagem do leite para a oferta ao filho durante o período do tratamento.

- Não confie no conteúdo da bula do medicamento. As informações contidas em bulas sobre esse tema, frequentemente, não estão alinhadas com as evidências científicas sobre a segurança dos medicamentos para uso durante a lactação.

- A idade do bebê deve ser levada em consideração. Prematuros e recém-nascidos são mais suscetíveis aos efeitos adversos de produtos usados pela nutriz, devido à imaturidade dos sistemas de metabolização e excreção.

- Levar em consideração o tipo de alimentação do lactente. Aqueles em aleitamento materno exclusivo serão mais expostos aos produtos utilizados pela mãe do que lactentes em aleitamento misto ou já em alimentação complementar.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545