Do BLOG da Editora Timo
por Dr. Moises Chencinski - colunista
23/11/2024
Dia desses, no grupo de WhatsApp da Rede IBFAN Brasil (Rede Internacional em Defesa do Direito de Amamentar) do qual participo, escutei de novo essa frase que me impactou como da primeira vez (obrigado, Rodrigo Carvalho).
E, como da primeira vez, fui pesquisar sua origem e, logicamente, veio a ideia desse texto pela profundidade e abrangência de seu significado. Então, senta que lá vem história.
Do latim “Nihil de nobis, sine nobis”, entre as várias teorias, uma delas atribui sua procedência às tradições políticas da Europa Central, mais precisamente à legislação constitucional da Polônia (1.505).
Essa frase também fez parte do título de um documentário de Krzysztof Kieślowski, diretor e roteirista polonês, de 1972, para a televisão (Workers '71: Nothing About Us Without Us), que foi censurado por abordar trabalhadores discutindo as razões das greves em massa de 1970 em seu país.
Já em 1990, essa frase passou a fazer parte do ativismo pelas Pessoas com Deficiência (PCD), após passar por conferências internacionais anteriores sobre os seus direitos. Em 1998, esse “slogan” foi usado como título de dois livros (James Charlton e David Werner) ainda abordando a mesma temática.
Em 2004, as Nações Unidas usaram essa frase como tema do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (3 de dezembro, desde 1992), que visava promover uma sensibilização e mobilização de apoio para a dignidade, direitos e bem-estar das pessoas com deficiência, aumentando a conscientização sobre a inclusão e integração de pessoas com deficiência em todos os aspectos da vida política, social, econômica e cultural.
Desde o ano de 2009, o Decreto que promulga a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência em seu artigo 5 (Igualdade e não-discriminação) reconhece que “todas as pessoas são iguais perante e sob a lei e que fazem jus, sem qualquer discriminação, a igual proteção e igual benefício da lei” e que será proibida “qualquer discriminação baseada na deficiência e garantirão às pessoas com deficiência igual e efetiva proteção legal contra a discriminação por qualquer motivo”.
Em 2016, foi publicado, pelo Ministério da Justiça e Cidadania e Secretaria Especial dos Direitos da Pessoa com Deficiência, um novo documento que reforça e atualiza o Decreto de 2009.
O conceito da frase pode refletir vários cenários nos quais as decisões são tomadas por quem não é, não conhece, não vivencia as situações. Seria como se esse Decreto sobre PCD fosse elaborado sem a participação ativa dos próprios PCDs.
Seria como se apenas, ou principalmente, homens legislassem sobre questões do corpo feminino, ou como se apenas, ou principalmente, pessoas de cor branca decidissem a respeito de assuntos de recortes raciais de forma geral. Por muito tempo foi assim, mas, agora, em grande parte das situações... ainda é assim.
Sabe aquela história de pais que resolvem dar aos filhos “tudo aquilo que eles não tiveram”, sem relevar aquilo que os filhos querem ou de fato precisam? Pais são responsáveis pela educação e desenvolvimento, por propiciar condições para um crescimento saudável, ético, com cidadania. E, sempre com amor e respeito, com diálogo e abertura.
E, adivinhem só!!! Na amamentação isso é diferente?
Quem é protagonista na amamentação?
A decisão sempre é, ou pelo menos deveria ser, da mãe em “parceria” com a sua cria.
Devem existir rede de apoio, ambientes acolhedores e respeitosos, profissionais éticos e atualizados, sem conflitos de interesse, informação e comunicação de boa qualidade e políticas públicas que favoreçam a dupla mãe-bebê, dentro de seus planejamentos e necessidades e tudo o mais que já sabemos.
Licença-maternidade, paternidade, parental, para recém-nascidos a termo e prematuros, amamentação em qualquer hora e lugar sem constrangimento, salas de apoio à amamentação, direito a creches e horários diferenciados para extração de leite.
Essa é uma lista de “direitos”.
Será que aí aconteceu a participação direta ou através de uma pesquisa com as pessoas interessadas? Será que elas, as mães, foram consultadas para analisar suas necessidades e seus anseios reais?
Será que aí aconteceu a consulta a todos os recortes raciais, sociais, econômicos, em mães trabalhadoras formais e informais, e que, além da equidade, foi levada em conta a justiça, eliminando obstáculos ao pleno usufruto dos direitos para todas?
Repetindo e concluindo:
Nada sobre nós, sem nós.
Ou será que somos nós que não queremos participar?
Já pensou sobre isso? Vamos ainda aceitar o que os outros resolvem dar para nós (“tudo aquilo que eles não tiveram”), e não o que nós queremos para nós?
O futuro dependerá daquilo que fazemos no presente.
Mahatma Gandhi
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545