Do site da Crescer
O pediatra Moises Chencinski reflete sobre o uso de smartphones por crianças e jovens, a proibição dos dispositivos eletrônicos nas escolas e a dependência, cada vez maior, desses aparelhos. Confira!
por Dr. Moises Chencinski - colunista
04/01/2025
Vejam essas estatísticas de um estudo recente:
- Checar seus celulares 205 vezes por dia (42% a mais do que em 2.023).
- 89% usam ou olham o celular durante um filme no cinema (52% acima de 2.023).
- 81% verificam seus celulares nos primeiros 10 minutos após acordar.
- 78% se sentem desconfortáveis em deixar o telefone em casa.
- 76% verificam seus telefones até cinco minutos após receber uma notificação.
- 66% usam o telefone no banheiro.
- 54% enviaram mensagens de texto para alguém na mesma sala.
- 51% dormem com o telefone à noite.
- 48% nunca ficaram mais de 24 horas sem o celular.
- 43% consideram-se “viciados” nos seus celulares.
- 40% sentem pânico ou ansiedade quando a bateria do telefone fica abaixo de 20%.
- 38% usam ou olham o celular durante um encontro.
- 27% usam ou olham o telefone enquanto dirigem.
- Gasto de 5 horas por dia nos celulares (mais de 2,5 meses - 76,3 dias) a cada ano.
Assustador? Com qual desses 14 dados você “conhece alguém” que se identifica? E você cabe em alguma dessas estatísticas? Qual delas mais te surpreendeu?
Esse estudo não foi feito no Brasil. Mas, poderia. E poderia muito. Essa “pesquisa” contou com as entrevistas de 1000 americanos com 18 anos ou mais (nível de confiança de 95%) e foi publicada no site REVIEWS.org no dia 1º de janeiro de 2.025, baseada em respostas a um questionário que comparava os dados de 2.023 com 2.024.
E isso afeta de forma diversa as diferentes gerações (classificadas aqui por época de nascimento - sugeridas pelo Pew Research Center, grupo americano de pesquisas demográficas), quer seja no tempo de tela do Smartphone e vício no uso, na checagem diária ou na ansiedade gerada pela perda do celular.
Geração Silenciosa (1928-1945) – nascidos entre as duas guerras (79 a 96 anos).
Baby-boomers (1946-1964) – nascidos no pós-guerra (60 a 78 anos).
Geração X (1965-1980) – da qual ninguém sabia o que esperar (44 a 59 anos).
Geração Y (1981-1996) – também conhecida como Millenials (28 a 43 anos).
Geração Z (1997-2012) – nativos digitais (12 a 27 anos)
Lembrando que a idade mínima limite para responder o questionário foi de 18 anos. Esses dados, certamente seriam diferentes se levassem em conta a Geração X (12 a 27 anos) em sua totalidade ou se incluíssem, também, a geração Alpha (a que já nasceu “dentro” dos smartphones e das redes sociais - a partir de 2013).
E o celular nas escolas?
Esses dados acima foram relacionados aos adultos. Mas e em relação às crianças? Será que é tão prejudicial assim? Não aumenta a segurança o uso dos celulares nos ambientes escolares? E se meu filho precisar falar comigo urgentemente?
O PL 4932/2024 teve como base os dados do PISA-2022 (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) divulgados pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) que comprovaram interferência do uso de smartphones nos resultados dos testes:
- Os estudantes que passam até uma hora por dia na escola em dispositivos digitais para lazer obtiveram 49 pontos a mais em matemática do que os alunos cujos olhos ficavam grudados nas telas entre cinco e sete horas por dia.
- Cerca de 65% dos estudantes afirmaram que ficaram distraídos nas aulas de matemática pelo uso de celular e outros dispositivos, como tablets e laptops.
- No Brasil, esse percentual chegou a 80%, assim como na Argentina, no Canadá, Chile, na Finlândia, Letônia, Mongólia, Nova Zelândia e no Uruguai.
- Outros 59% relataram que a distração foi causada por colegas estarem usando os dispositivos com 15 pontos a menos nos testes de matemática.
- Em países como o Japão e a Coreia (resultados acima da média), o nível de distração relatado pelos alunos foi de 18% e 32%, respectivamente.
O PISA-2022 foi aplicado em 690 mil estudantes de 81 países, entre eles o Brasil.
Esses e muitos outros aspectos foram levados em conta para a proposta e aprovação pela Câmara dos Deputados e pelo Senado (17/12/2024), do PL 4932/2024, aguardando apenas a sanção presidencial para entrar em vigor, resumido nesse artigo (com as poucas exceções estabelecidas dentro do PL):
“Art. 2º Fica proibido o uso, por estudantes, de aparelhos eletrônicos portáteis pessoais durante a aula, o recreio ou intervalos entre as aulas, para todas as etapas da educação básica.”
Além da urgente sanção presidencial, será necessário treinamento da equipe das escolas tanto na supervisão e orientação necessárias para a implementação da lei quanto no acompanhamento dos resultados emocionais dos alunos, e até de suas famílias, por conta da “privação” e da “abstinência” e encaminhamentos necessários.
Afinal, a NOMOFOBIA (No mobile phobia – ansiedade e medo de ficar longe do celular, da falta de conexão com internet, de bateria ou até de desligar o aparelho) é um quadro reconhecido e que traz consequências danosas além de um tratamento especializado necessário e, muitas vezes, prolongado.
Essa proposta já teve implementação em algumas escolas particulares no Brasil e, com a restrição do uso de celulares, houve melhoria do aproveitamento, do comportamento e até redução do bullying.
Suíça, Portugal, Espanha e Austrália já baniram os aparelhos do dia a dia dos alunos nas escolas. A Austrália vai além com um projeto de proibir acesso a menores de 16 anos às redes sociais, com estudos e pesquisas comprovando prejuízos à saúde mental e à segurança de crianças e adolescentes.
Pensamentos. Reflexões. Considerações.
- Esse controle e supervisão são tão necessários e vitais assim?
- Esses dados acima (americanos) falam também para a nossa cultura e sociedade no Brasil?
- Alguém pode se considerar “imune” a esse tipo de abordagem?
- Qual a idade segura para que os pais ofereçam celulares para seus filhos dentro e fora da escola, minimizando os riscos reais?
- Como informar sobre o prejuízo social e educacional de crianças e adolescentes a gerações (X, Y, Z, Alpha) que sempre viveram sob o “domínio” dessa tecnologia e que não têm a percepção dos riscos?
- Como abordar, de forma informativa e educativa, a relevância do controle do uso de aplicativos e da presença nas redes sociais a “pessoas em formação” neurocognitiva e social, que são “presas” mais vulneráveis da expertise dos profissionais que cativam esses “seguidores” com falsas promessas de “views”, “likes” e resultados mais fáceis de sucesso?
Essa conversa e essa reflexão não começam e não acabam aqui. Elas devem ser contínuas, com avaliações da nossa realidade, do que acontece de fato no Brasil. E todos nós somos responsáveis pelos resultados das novas gerações e de seu relacionamento com a tecnologia.
Acho que merece uma live.
Aguardem. Até bem breve.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545