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Amamentação: o “certo” ou a “verdade”? Dá para conciliar os dois?

Do BLOG da Editora Timo

por Moises Chencinski - colunista

05/04/2025

São só dois lados da mesma viagem
O trem que chega é o mesmo trem da partida.

Esse é um trecho da composição “Encontros e Despedidas”, de Milton Nascimento e Fernando Brandt, lançada em 1985, que abre o significado desse texto. Vem comigo.

Lado A – “Encontros”

A recomendação da Organização Mundial de Saúde é o aleitamento materno desde a sala de parto até 2 anos ou mais, exclusivo e em livre-demanda até o 6º mês, quando se inicia a alimentação complementar saudável.

Essa recomendação, quando seguida, pode prevenir 20.000 casos de câncer de mama, 832.000 mortes de crianças abaixo de 5 anos por diarreia e doenças respiratórias e trazer uma economia de 302 bilhões de dólares, tudo isso no período de um ano.

Amamentar traz inúmeros benefícios ao bebê com o padrão-ouro da alimentação infantil (o leite materno), prevenção e redução de doenças infectocontagiosas, alérgicas, melhora da digestão com menos cólicas, controle maior do sobrepeso e da obesidade infantil, entre muitas outras.

Amamentar traz, também, benefícios para as mães desde a primeira hora de vida, diminuindo o sangramento pós-parto e favorecendo a volta do útero ao seu tamanho normal mais rapidamente, diminui os riscos de câncer de mama e ovários, reduz chances de diabetes e hipertensão arterial além de proteger contra a depressão pós-parto.

Lado B – “Despedidas”

Mães que amamentam, especialmente sem uma rede de apoio adequada, relatam exaustão física e mental, agravada pelo trabalho de cuidados que recai principalmente sobre as mulheres, podendo levar a um quadro conhecido como burnout parental.

Frustrações fazem parte da vida do ser humano, mas, nessa fase, assumem uma relevância significativa pelas expectativas sobre a maternidade idealizada. Mães, mesmo informadas e apoiadas, podem não conseguir ou não querer amamentar.

A volta ao trabalho, quer seja na informalidade ou mesmo com licença-maternidade (de 4 ou 6 meses), costuma gerar culpa e peso desproporcionais, com decisões (sair do trabalho para ficar com o filho ou voltar a trabalhar e compartilhar o cuidado da criança) que podem trazer insatisfação, desconexão e até questões de saúde física e mental da mãe (insônia, alterações de humor, apetite, libido), aumentando o risco do desmame evitável e inoportuno.

O marketing é um dos maiores influenciadores na “indústria do desmame”, aproveitando-se dos desafios da maternidade e da amamentação. O sono muito irregular do bebê (por consequência da mãe), as cólicas e os gases, as regurgitações, o choro, a busca pelo colo são situações reais, transitórias, transformadas em obstáculos à “qualidade de vida” da mãe, por técnicas de publicidade para promoção e venda de produtos que concorrem com o aleitamento materno (chupetas, mamadeiras, produtos lácteos comerciais).

E agora?

Uma frase de um post publicado no perfil do Rabino Nilton Bonder me chamou demais a atenção (aliás, foi a causa desse texto):
A mente fala o certo e o coração fala a verdade”.

E entramos naquele debate interminável entre seguir o que diz a mente e o que recomenda o coração.

Não há como negar os fatos, a importância dos estudos científicos (os sérios, éticos e sem conflitos de interesse) e de sua divulgação e comunicação.

Já o aconselhamento (escuta ativa, empatia, sem julgamentos), técnica que deveria ser aprendida por todas as pessoas que estudam e trabalham com o ser humano, tende a traduzir o real sentimento, as emoções, o que de fato se passa no coração das mães e que, muito poucos profissionais, amigos e até familiares se preocupam de fato.

Nada acontece por acaso.

Essa é uma das frases mais presentes no que eu escrevo, falo ou apresento em palestras ou aulas. Eu tenho necessidade absoluta de entender os porquês, a raiz de tudo e, como “xereta profissional” a busca não tem fim.

“Do nada”, caiu nos meus olhos um outro post (lindo), esse da AFRO.TV Brasil: Xirê Àlágabé – Cantiga para Nanã Nº 2, que começa assim:

Nanã, senhora do tempo e da sabedoria,
Mãe da vida antiga, ventre da terra molhada,
guia meus passos com paciência e firmeza,
ensina-me a esperar sem angústia
e a compreender que tudo chega na hora certa”.

Mas nem foi esse começo que mais me chamou a atenção.

Com fé sigo, pois quem aprende com o tempo,
encontra a verdadeira sabedoria”.

Talvez aí esteja a resposta.
A verdadeira sabedoria.
O certo e a verdade.
O aprendizado com o tempo.
A espera sem angústia.

Cada mãe é única.
Cada bebê é único.
E cada mãe e cada bebê importam.
Não há como estabelecer uma regra geral.
Não se pode julgar uma escolha.
Até porque essas escolhas não necessariamente serão definitivas.
Cada um tem suas próprias escolhas. Cada um tem seu próprio tempo.

Todos os dias quando acordo
Não tenho mais o tempo que passou
Mas tenho muito tempo
Temos todo tempo do mundo
Temos nosso próprio tempo
Tempo Perdido – Legião Urbana

Antes de terminar, vale um esclarecimento. Não estudo profundamente a cultura afro (deveria). Mas, vivendo no Brasil, não há como entender nosso presente sem levar em conta todas as culturas que nos trouxeram até aqui. E, falando de Brasil, que triste falha no ensino da base de nossas raízes. Além dos imigrantes, o Brasil tem, em sua base, a cultura indígena e a africana.

Assim, trazendo um pouco de luz:
"Nanã é um importante orixá feminino relacionado com a origem do homem na Terra."

Descubra mais nesse texto, que poderia (deveria) ser de conhecimento mais público, do site Brasil Escola do UOL.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545