Do site da Crescer
O pediatra Moises Chencinski, colunista da CRESCER, reflete sobre o conhecimento materno sobre amamentação
por Moises Chencinski - colunista
25/04/2025
Entre as mensagens de WhatsApp que eu recebi hoje, uma delas era sobre um Webinar internacional promovido pelo Comitê de Aleitamento Materno da ALAPE (Associação Latino-americana de Pediatria) com o tema:
O que o pediatra deve saber sobre o aleitamento materno, com duas apresentações:
- Dicas para que seu bebê consiga uma boa pega.
- A composição do leite humano e seu valor imunológico.
São dois assuntos relevantes, importantes para a atualização do conhecimento dos profissionais que atuam na saúde materno-infantil, em especial o pediatra. E sempre que se aborda algum ponto a respeito do aleitamento materno, é fundamental que se recorde que esse é um assunto que tem dois protagonistas: a mãe (lactante) e o bebê (lactente).
Assim, todo o conhecimento adquirido deve ser utilizado pelos profissionais com o foco na informação, na conexão, na comunicação com as mães. Esse saber deve ter a meta de proteger, apoiar e promover a amamentação.
E, entre todos os profissionais de saúde materno-infantil, o pediatra é o que tem o primeiro e o maior contato com as mães, especialmente no primeiro ano de vida, e, de forma muito marcante, no início da vida do recém-nascido, época muito determinante do início e manutenção do aleitamento materno.
Cabe, também, ao pediatra ser parte de uma equipe multiprofissional para acolhimento da dupla mãe-bebê, e, junto com outros especialistas de outras áreas, proteger, apoiar e promover a amamentação.
Mas e o outro lado da moeda?
Muito do entendimento sobre o aleitamento materno vem da ciência. Mas grande parte dessa compreensão, talvez a mais nuclear, a mais ancestral, a mais raiz está... com as mulheres, mães, lactantes.
São elas que amamentam. São elas que têm essa experiência. São elas as responsáveis pela tradição, pela cultura, pela continuidade do processo, geração após geração.
Se hoje, apesar de todos os desafios enfrentados na sociedade, no trabalho, nas leis que ainda precisam evoluir, na falta das redes de apoio suficientes, na opressão insana do marketing das indústrias de produtos lácteos comerciais, através das redes sociais pelos influenciadores digitais, ainda se amamenta, isso se deve à perseverança, resistência e resiliência das mulheres.
Não me lembro quando foi a última vez que eu vi um curso, uma live, um webinário administrado por mães, se é que teve algum, com a transmissão do seu conhecimento, de suas práticas, de sua experiência para pediatras e outros profissionais da área.
Tempo desperdiçado? Dados não utilizados? Material riquíssimo perdido? Vivências desconsideradas?
O que os pediatras precisam escutar das mães sobre amamentação?
Para manter a coerência óbvia de que as mães precisam ser escutadas em sua expertise, algumas “aulas” seriam fundamentais para orientar os pediatras e outros profissionais que atuam na área materno-infantil.
Algumas questões são fundamentais para que, junto com a informação e a ciência, que devem fazer parte da educação básica e da cultura de nossa sociedade, possamos contribuir para a melhor experiência de cada mulher que quer amamentar.
Ciência importa. Ancestralidade importa. Comunicação define. Transgeracionalidade determina. Atualização sem negacionismo. Escuta com empatia.
Dez dicas que todo pediatra deveria receber das mães (se ele perguntasse e de fato escutasse), após esclarecer as dúvidas e orientar o que é importante para que uma lactante que deseje amamentar atinja seus objetivos:
- Quem decide se uma mãe vai amamentar ou não?
- Qual a melhor posição para uma mãe amamentar?
- Como definir o intervalo entre as mamadas?
- Quanto tempo deve durar cada mamada?
- A mãe deve oferecer um ou os dois seios por mamada?
- Onde uma mãe pode amamentar?
- Onde um lactente vai dormir?
- Existe alguma maneira mais eficaz de colocar um bebê para dormir?
- Como alimentar um lactente quando a mãe volta ao trabalho?
- Quando uma mãe deve desmamar?
O que eu aprendi com as mães
Lá se vão (algumas) décadas desde que eu me graduei na faculdade de medicina e um pouco menos que eu defini que seria um pediatra.
Muitas mudanças ocorreram na minha atuação como profissional da área de saúde materno-infantil que vieram da vivência e da experiência que tive na profissão. Outras tantas transformações ocorreram com o meu amadurecimento como ser humano e pai. Nem sei contar quantas aconteceram por conta de colegas que conquistaram meu respeito e minha admiração e me influenciaram mostrando que o caminho não é único e que não cabe a mim julgar nada ou ninguém. Isso sem contar as consequências da passagem do tempo no que diz respeito à cultura, à evolução (ou, em alguns casos estagnação ou até involução) da sociedade, das leis, das economias.
Durante esses anos, aprendi muito com a escola, com a ciência que nunca deve ser esquecida, menosprezada ou negada. Ética e moral são conceitos totalmente concretos e não deveriam ser manipulados por interesses pessoais ou institucionais oportunistas.
Mas, não há como negar o tamanho e a importância de tudo o que eu aprendi, e ainda aprendo diariamente, com as mães. Gratidão imensa e um pedido de desculpas pelas vezes em que eu questionei ou critiquei ou julguei qualquer fala ou atitude de alguma mãe, durante meus atendimentos.
E a certeza de que nunca, em momento algum, deve-se duvidar da intuição de uma mãe em relação às preocupações sobre a saúde de sua cria, por mais inaceitável que ela possa parecer no momento.
“Ser intelectual é usar sobretudo a inteligência, o que eu não faço: uso é a intuição, o instinto”.
Clarice Lispector
”Intuição é percepção através do inconsciente”.
Carl Jung
E eu não me arrisco a desafiar o inconsciente de uma mãe.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545