Do portal Sentir Bem
Ainda estamos na maior epidemia de DCNT (doenças crônicas não transmissíveis) do século, segundo a OMS (a obesidade), e o controle está distante.
08/07/2014
Pelo menos, o mundo passou a enxergar que está engordando e começa, a passos bem lentos, a travar uma batalha contra o gasto excessivo de dinheiro, tentando aumentar o atual pequeno gasto de calorias.
Até 2012, não havia nenhuma menção a crianças nos consensos e diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia, como na IV Diretriz Brasileira sobre Dislipidemias e Prevenção de Aterosclerose (2007). E não havia ainda diretriz de Hipercolesterolemia familiar.
Nos últimos 2 anos, começam a aparecer entre as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia – 2011 - 2013 (Pocket Book), alguns sinais de que temos que prestar mais atenção a uma das possíveis raízes do problema: as crianças. Vejam as recomendações de duas das mais recentes publicações da Sociedade Brasileira de Cardiologia.
V Diretriz Brasileira De Dislipidemias E Prevenção Da Aterosclerose (pg.62)
Tabela 29 – Crianças e adolescentes
Recomendações
Recomenda-se a determinação do perfil lipídico a partir dos 2 anos de idade quando:
(1) Avós, pais, irmãos e primos de primeiro grau apresentem dislipidemia, principalmente grave ou manifestação de aterosclerose prematura;
(2) Há clínica de dislipidemia;
(3) Tenham outros fatores de risco;
(4) Há acometimento por outras doenças como hipotireoidismo, síndrome nefrótica, imunodeficiência, etc.;
(5) Há utilização de contraceptivos, imunossupressores, corticoides, antirretrovirais e outras drogas que possam induzir elevação de colesterol.
I Diretriz Brasileira De Hipercolesterolemia Familiar (HF) (pg.157)
Devemos triar o perfil lipídico em criança entre 2 e 10 anos, quando:
(1) Tenham pais ou avós com história de doença arterial isquêmica em homens com menos de 55 anos e em mulheres com menos de 65 anos;
(2) Tenham pais com colesterol total superior a 240 mg/dl;
(3) Apresentem outros fatores de risco como hipertensão arterial sistêmica, obesidade, tabagismo, diabetes melitus, nascidos pequenos para a idade gestacional, dieta rica em gorduras saturadas e/ou ácidos graxos trans;
(4) Utilizem drogas ou sejam portadoras de doenças que cursam com dislipidemia (síndrome da imunodeficiência humana, hipotireoidismo, doença de Cushing, etc.);
(5) Possuam manifestações clínicas de dislipidemias (xantomas, xantelasmas, arco corneal, dores abdominais recorrentes, pancreatites).
(6) Acima de 10 anos, toda criança deve ter dosado, ao menos uma vez, seu colesterol total, independentemente da presença de fatores de risco.
Muito se fala sobre o colesterol, mas é importante conhece-lo um pouco melhor.
Então, deixe-me apresentar a vocês o colesterol em capítulos.
- O colesterol é uma gordura de origem exclusivamente animal. Assim, não temos nenhum óleo ou azeite com colesterol (banha de porco não é óleo).
- O colesterol é um componente importante de nosso organismo. Ele é base para a síntese de vitamina D, ácidos biliares, hormônios esteroides e da bainha de mielina (que é a “capinha” de gordura fundamental que "encapa" nossos nervos).
- O colesterol é produzido pelo fígado. Cerca de 2/3 de todo colesterol que temos no sangue vem do fígado. Apenas 1/3 desse colesterol deve vir de nossa alimentação.
- O colesterol é apenas 10% da gordura que recebemos na nossa alimentação. Os triglicérides são responsáveis pelos outros 90%. Assim sendo, uma dieta para redução de triglicérides é muito mais eficaz que uma para reduzir colesterol.
- O colesterol é composto de 3 frações: o HDL (bom colesterol – taxa boa é acima de 40), o VLDL (ligado aos triglicérides) e o LDL (colesterol ruim – taxa boa abaixo de 100 até 19 anos).
- O colesterol total alto pode ou não ser ruim de acordo com qual fração está aumentada. HDL aumentado é conseguido através de herança genética, de uma boa alimentação e de atividade física. LDL aumentado acontece por herança genética, alimentação inadequada, obesidade, hipertensão, sedentarismo, entre outros.
- O colesterol é transportado no nosso corpo pelo sangue por proteínas que se ligam a ele (LDL e HDL). O LDL colesterol é o que se deposita nas paredes dos vasos e o HDL é o que tenta trazer o excesso de colesterol do sangue de volta ao fígado para que seja eliminado através da bile.
A partir de 2.001, quando houve a transcrição do DNA, foram descobertos genes que controlavam várias funções em nosso organismo, entre eles os reguladores do colesterol. A partir de então, desenvolveram-se estudos em duas áreas não tão conhecidas e divulgadas para o público mais leigo:
A Nutrogenômica que estuda como alimentos, nutrientes e outros compostos bioativos ingeridos influenciam o genoma.
A Epigenética que estuda as mudanças na atividade do gene que não envolvam alterações na sequência do DNA.
Concluindo: a alimentação não consegue mudar o DNA, mas consegue influenciar sua ação e, uma vez modificada, essa informação pode ser transmitida geneticamente aos descendentes.
Através de muitos estudos, avaliou-se a influência da alimentação durante os primeiros mil dias (9 meses de gestação e os dois primeiros anos de vida) na manifestação de genes.
A alimentação adequada da gestante, pobre em gorduras e frituras, mas bem equilibrada com frutas e fibras pode inibir a manifestação do gene responsável pelo aumento do colesterol.
O leite materno é riquíssimo em colesterol. O organismo recebe essa informação e regula a produção do colesterol pelo fígado e quanto mais tempo dura o aleitamento, maior esse controle. Assim, quando se suspende o aleitamento, e mantendo-se uma alimentação equilibrada especialmente nos dois primeiros anos de vida, mas também durante toda a vida, há um controle maior na produção do colesterol (importante como precursor de substâncias importantes no nosso organismo, como já vimos).
A não-oferta do leite materno, bem como uma alimentação irregular das gestantes e nos dois primeiros anos de vida, não regulam essa produção, fazendo com que o fígado se apresse em lançar o colesterol no sangue e mantenha sua alta “performance” nesse campo, aumentando, assim, as taxas dessa substância no sangue.
Isso explica a mudança do padrão de aumento de colesterol que teve um aumento de prevalência tão importante que fez com que a Sociedade Brasileira de Cardiologia incluísse, desde 2012, a pesquisa do colesterol como rotina em idades muito mais precoces (já a partir dos 2 anos de idade) nas suas duas últimas diretrizes já citadas (V Diretriz Brasileira De Dislipidemias E Prevenção Da Aterosclerose e I Diretriz Brasileira De Hipercolesterolemia Familiar).
Um estudo recente da Associação Médica do Canadá de agosto de 2013 concluiu que o comportamento alimentar inadequado em pré-escolares (3 a 5 anos de idade) pode ser importante fator determinante de aumento de LDL colesterol e de risco de problema cardiovascular, merecendo mais estudos para determinar ações de proteção.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545