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"Que seu remédio seja seu alimento, e que seu alimento seja seu remédio"

Esse artigo foi publicado na Revista Vínculo, ed. 07 - abril/2014 - pg. 16 a 19

O que é a APLV? O pediatra Moisés Chencinski explica, reitera a frase de Hipócrates e ainda acrescenta: “A prevenção e o tratamento estão na alimentação.”

Por por Simone de Carvalho, mãe de Rebeca e Rafael e Nina Ulup, mãe de João, 1 ano

O que é APLV?

APLV é uma sigla que significa ALERGIA À PROTEÍNA DO LEITE DE VACA.

Apesar de ser uma definição clara, há muita confusão feita a respeito do diagnóstico e do conceito.

As proteínas responsáveis pelo quadro de alergia são a CASEÍNA e a BETALACTOGLOBULINA. Há uma diferença na proporção dessas proteínas e da ALFALACTOALBUMINA entre o LV e o LM.

Ela não tem relação com a LACTOSE (que é um açúcar), que pode provocar, pelo seu excesso, um quadro conhecido como INTOLERÂNCIA À LACTOSE.

A alergia alimentar tem uma incidência de 2 a 6% das crianças no Brasil. Entre essas, 85% são APLV. Na nossa estatística, 2,5% das crianças apresentam APLV. Parece muito mais, não é mesmo? Assim, temos que ter muito cuidado com o diagnóstico.

Por que o diagnóstico é tão difícil de ser comprovado?

O diagnóstico de APLV é baseado nos sintomas clínicos (que são comuns a muitas doenças), seguidos de uma dieta de exclusão e depois de um teste de provocação, que se fosse adequado deveria ser feito em ambiente hospitalar. Muito difícil, não é mesmo?
Pela dificuldade diagnóstica e de abordagem, muitos são os profissionais envolvidos: pediatra, gastroenterologista pediátrico, alergista pediátrico, nutricionista, pra começar.

E isso não é demérito a nenhum deles. É um diagnóstico que cabe a todas essas áreas.

O crescimento pode ser um fator importante na avaliação da recuperação da APLV. Muitas vezes, uma criança mesmo sem sintomas após o acompanhamento adequado pode não ganhar peso e esse ser ainda um sinal de que o quadro não está ainda sob controle. O que não quer dizer que uma criança que não cresça ou não engorda tenha APLV.
SINTOMAS de APLV, por serem alérgicos, podem acometer vários órgãos e sistemas: digestório (sangramento, diarreia, vômitos, náuseas), pele (dermatites, urticária, inchaço dos olhos, lábios), respiratórios (rinites, bronquites, laringites), gerais (dificuldade de ganhar peso, irritabilidade, alterações de sono). Vale lembrar que os sintomas são sempre SUGESTIVOS DE APLV e não PATOGNOMÔNICOS (quer dizer que são sintomas que estão presentes apenas nessa doença – exemplo, as bolinhas da catapora, as cáries nos dentes, etc).
Alguns exames de sangue e pesquisa de sangue oculto nas fezes podem ajudar no diagnóstico, mas são, em grande parte das vezes, mal interpretados. Assim, merece cuidado a sua solicitação e a sua avaliação.

Qual a real situação deste diagnóstico entre as crianças no mundo e no Brasil? Por que cada vez mais temos crianças com APLV?

Atualmente, as últimas estatísticas ainda mostram uma incidência de cerca de 2,5 a 3% entre crianças e até 6% de adultos com APLV.
Essa incidência está aumentando por várias razões:

- Mães e pediatras estão mais atentos aos sintomas;

- Estudos recentes sobre epigenética mostram uma mudança no padrão de tolerâncias a alergenos de forma geral. Hoje temos algum representante alérgico em cada família. Temos cada vez mais quadros dermatites atópicas, de rinite, de bronquites nas famílias atualmente.

- Mudanças culturais e ambientais levando a estímulos excessivos, sensibilizando cada vez mais o ser humano, propiciando um aumento de reações do nosso organismo, por exemplo, no aumento de incidência de doenças autoimunes (tireoidites, síndrome do colo irritável, doenças reumatológicas, câncer, entre muitas outras).

O que não adianta ser feito?

Não adianta suspender o Aleitamento Materno.

Não adianta substituir o LV por leite de outro animal (cabra, búfala, égua, etc).

Não adianta usar alimentos que têm só "traços de leite".

Não há medicamento que trate a APLV.

Não adianta "automedicar".

Não adianta se desesperar e tentar alternativas não recomendadas, indicadas por "amigas com o mesmo problema", "por outros profissionais ou não-profissionais com métodos não reconhecido cientificamente".

Não adianta adiar a busca ao pediatra ou ao especialista recomendado e indicado.

Qual a influencia da APLV na amamentação?

Não existe nenhuma recomendação para suspensão do aleitamento materno, em qualquer idade, em casos de APLV. A questão é a alimentação da mãe que pode ser modificada para que haja uma proteção e o tratamento para o quadro.

A amamentação protege contra a APLV.

Existem métodos preventivos a curto e longo prazo? O que a restrição da mãe da ingestão de derivados do leite animal pode ajudar?

Para prevenir a APLV podemos nos embasar nos primeiros mil dias do bebê (9 meses = 270 dias de gestação + os 2 primeiros anos de vida do bebê = 730 dias).

Como dizia Hipócrates (460 a.C – 370 a.C), conhecido como o pai da Medicina, há muitos, muitos, mas muitos anos mesmooo: "Que seu remédio seja seu alimento, e que seu alimento seja seu remédio". A prevenção e o tratamento estão na alimentação.

Esse é um dos fatores determinantes do sucesso da manutenção do AM em crianças APLV. E a restrição do leite e derivados da alimentação materna é a parte fundamental do TRATAMENTO desse quadro.

Muitas vezes isso não é suficiente porque a proteína do LV não está presente APENAS no leite de vaca. E muitas vezes, ela está “escondida” nos alimentos com outros nomes. E você sabia que existem produtos de higiene infantil (xampus, lenços umedecidos, sabonete, cremes, etc.) com proteína do LV?

Mas é importante que se entenda que essa dieta NÃO É FÁCIL para as mães. Todo o apoio deve ser dado a essa mãe que pretende manter o AM, que é fundamental para o bom crescimento e desenvolvimento do bebê, além de proteger contra APLV e outras alergias alimentares.

O desmame não é solução. Porém devemos respeitar os limites de cada mãe, sem crucifica-las, mas sim apoiá-las em suas decisões. Mas que sejam decisões em mães informadas e bem orientadas.

O que a mãe pode fazer para evitar?

A gestante deve seguir uma alimentação equilibrada, saudável, sem restrições. É comprovado que não existe nenhum efeito protetor neste ou em qualquer quadro de alergia ou intolerância alimentar que seja prevenido pela exclusão de qualquer tipo de alimento durante a gestação.

A mãe pode seguir as orientações recomendadas pela OMS, pela SBP, pelos profissionais conscienciosos: ALEITAMENTO MATERNO desde a primeira hora de vida, exclusivo e em livre-demanda até o 6º mês, estendido até 2 anos ou mais.

É comprovado que não existe nenhum efeito protetor neste ou em qualquer quadro de alergia ou intolerância alimentar que seja prevenido pela exclusão de qualquer tipo de alimento durante a fase de aleitamento.

A introdução alimentar deve ser criteriosa, com calma, sem pressa, para que a criança tenha tempo para se adaptar a todas as mudanças relacionadas à sua alimentação, desde a questão dinâmica (reflexo de protrusão da língua, mastigação, digestão) até a questão digestória (enzimas, microflora intestinal adequadas).

Uma vez feita qualquer suspeita, entrar em contato imediato com seu pediatra para que possa ser dado início, o quanto antes, a um processo adequado de investigação e acompanhamento relacionados ao quadro.

Como tratar?

Após um diagnóstico adequado, deve-se orientar a suspensão total de leite e derivados na alimentação materna de mães de bebês até o 6º mês em AME.

Em bebês em alimentação mista, deve-se considerar o controle de leites e derivados de sua alimentação, de acordo com a evolução e a avaliação dos profissionais envolvidos no tratamento.

Os pais devem ter em mãos listas de ingredientes e aprender a olhar a embalagem dos produtos antes de qualquer compra de alimentos. As proteínas do leite “se escondem” sob muitos disfarces, além de caseína, lactoalbumina e betagamaglobulina e é importante que eles possam ser identificados antes.  

Na impossibilidade do AM, as fórmulas apropriadas devem ter orientação dos profissionais que acompanham a criança (pediatra, gastroenterologista, nutricionista), bem como a suplementação de todos os nutrientes e vitaminas e  minerais necessários para o adequado crescimento e desenvpovlvimento das crianças.

Com o tempo, a APLV pode ser controlada e se induz a tolerância. Testes de provocação são feitos, sob supervisão da equipe que acompanha a criança APLV.

Há muitos sites com orientações e dicas sobre alergias alimentares e recomendações alimentares para crianças portadoras de APLV. 

Sites com orientações e dicas sobre alergias alimentares e recomendações alimentares para crianças portadoras de APLV