Quanto mais se pesquisa no Brasil, mais assustador é o panorama que se apresenta. Por outro lado, há muitas possibilidades de melhoria.
E a pergunta que surge: O que estamos esperando?
por Márcia Wirth
06/06/2014
A última pesquisa publicada recentemente foi o Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento em que quase 24.000 mulheres foram entrevistadas entre fevereiro de 2011 e outubro de 2012, em 296 maternidades públicas, privadas e mistas, em 191 cidades do Brasil.
Os dados dessa pesquisa da Fiocruz (Nascer no Brasil), que foi a primeira realizada sobre pré-natal, parto e nascimentos no país, foram coletados entre as puérperas na maternidade, 45 dias após a alta e entre 6 a 18 meses após o parto, e também através de entrevistas com os gestores dos hospitais.
Acompanhem os resultados:
• 30% das mulheres tiveram gestação atual indesejada;
• 9% não ficaram satisfeitas em terem engravidado;
• 2,3% tentaram interromper a gestação;
• 60% do total das gestantes iniciaram seu pré-natal tardiamente (após a 12ª semana de gestação) e 25% dessas não passaram pelo mínimo recomendável de 6 consultas de pré-natal;
• 59% das entrevistadas foram orientadas sobre a maternidade de referência para internação (essa orientação é lei desde dezembro de 2007 – Lei Nº 11.634);
• Quase 20% tiveram que procurar maternidade na hora do parto aumentando riscos para mãe e bebê (causas: falta de médicos, material e equipamentos).
• O SUS arcou com o pagamento de 80% dos partos (pública ou mista) e apenas 20% dos partos foram realizados em maternidades privadas;
• Cesarianas: 52% do total (a recomendação da Organização Mundial de Saúde é de que somente 15% dos partos sejam realizados por meio de procedimento cirúrgico);
• Índice de cesarianas em maternidades privadas: 88%;
• Cerca de 1.000.000 de mulheres são submetidas a partos cirúrgicos mal indicados por ano, aumentando riscos para a mãe, para o bebê trazendo, junto com isso, mais custos consequentes a essas indicações;
• 19% dos partos foram em adolescentes e entre essa 42% foram partos cirúrgicos;
• Entre as adolescentes, mais de 2/3 estavam em atraso escolar ou fora da escola, eram de classes D e E, com mais dificuldades de acesso ao pré-natal adequado e ao número mínimo de consultas;
• 70% das mulheres entrevistadas desejavam parto vaginal no início da gestação;
• Dessas, apenas 15% das que estavam em seu primeiro parto tiveram apoio na rede privada durante o pré-natal;
• Entre as que optaram por cesariana desde o início da gestação, 1/3 delas apontavam o medo de dor no parto como a principal razão pela escolha;
• A menor incidência de partos cirúrgicos ocorreu entre as mulheres que apresentavam a intenção de parto vaginal e se mantiveram assim durante a gestação (20% de cesarianas);
• Entre as mulheres com cesariana anterior, apenas 15% tiveram seu parto atual via vaginal;
• A presença contínua de acompanhante na sala de parto aconteceu em uma média de 18,7% dos partos.
• Partos prematuros (antes de 37 semanas): 11,3%;
• Partos entre 37 e 38 semanas: 35%;
• Separação mãe-bebê precoce foi maior em classes de maior poder aquisitivo e na cesariana;
• Em relação à recomendação atual do Ministério da Saúde (clampeamento tardio de cordão, contato-pele-a-pele, aleitamento materno na primeira hora de parto) que está descrita na portaria nº 371, de 7 de maio de 2014, mas que atinge, infelizmente, apenas partos realizados no SUS, os resultados foram desanimadores:
* Contato pele-a-pele: 26,6%;
* Aleitamento na sala de parto: 14,7%;
* Aleitamento na primeira hora de vida: 40,9%;
* Não há dados sobre clampeamento tardio de cordão.
Há outros dados relevantes na pesquisa, mas acredito que esses já sejam suficientes para alertar as autoridades governamentais, as entidades médicas envolvidas, os profissionais de saúde e a população do quanto ainda há que se fazer para que possamos oferecer um mínimo de dignidade, respeito e cuidado ao binômio mãe-bebê, pensando no futuro do país e dessa geração que se pretende que tenha uma expectativa de vida de 100 anos ou mais.
A Copa do Mundo do Brasil começa no dia 12 de junho e acaba dia 13 de julho. Estamos todos torcendo para que nossa seleção seja campeã mundial de futebol.
Mas isso não pode nos afastar das nossas preocupações e da responsabilidade com as crianças que são o futuro desse país, mesmo durante esse período. Atualmente somos campeões mundiais em cesarianas. Só podemos mudar essa triste e preocupante realidade se todos nos mobilizarmos. O que você já está fazendo para isso? Só torcendo? Não vai ser suficiente.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545